Boletim ACT - Edição 44
Dezembro de 2008
 
EDITORIAL

Aconteceu entre 16 e 22 de novembro, em Durban, África do Sul, o terceiro encontro da Conferência das Partes (COP) da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, muito bem sucedida. A COP 3 adotou diretrizes muito fortes sobre os artigos 5.3 (proteção das políticas públicas de saúde da interferência da indústria do tabaco), 11 (embalagem e etiquetagem) e 13 (publicidade, promoção e patrocínio). O desafio agora para nós, da sociedade civil, é trabalhar para assegurar a implementação dessas medidas.

Aproveitamos o momento para lançar a nossa segunda análise do status da CQCT no Brasil, e lembramos que o nosso papel é cobrar e monitorar sua implementação em nível nacional, que conclui que pouco se avançou desde a ratificação do tratado em termos de aperfeiçoamento da legislação já existente para adequação ao tratado. O relatório será lançado na próxima segunda-feira, 8 de dezembro por ocasião de evento na Academia Nacional de Medicina.

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PERFIL
Albino Oto Gewehr
ACT EM AÇÃO

Nova área no site: Ações Judiciais
Análise das medidas da CQCT
Assembléia Geral

Escritório no Rio de Janeiro
COP 3
Protesto em São Paulo

OPORTUNIDADES
Prêmio para uso de documentos internos da indústria
NOTÍCIAS
Uma névoa de falta de energia
Aquela nuvem que passa…
BAT teme explosão do contrabando de tabaco
COMISSÕES / Direitos Humanos
Contrabando
Ex-fumante ganha ação contra Souza Cruz
IRRESPONSABILIDADE SOCIAL
Confira a edição nº41 da Revista Diálogo
ENQUETE

Uma nova enquete já está no ar, sobre o presente de Natal que o controle do tabagismo poderia ganhar.

A última, sobre o relógio da morte, teve o seguinte resultado:

  • Alguns países membros da Convenção Quadro fazem muito, mas eles são poucos. A grande maioria não está preocupada de fato com as mortes causadas pelo tabagismo - 36,36%
  • Grande parte dos países membros da Convenção Quadro está fazendo o possível para deter a epidemia, mas a indústria do tabaco interfere de forma muito forte nas decisões dos governos - 27,27%
  • Todas as respostas acima - 18,18%
  • Não acredito neste relógio - 18,18%
EDITORIAL
Paula Johns

Aconteceu entre 16 e 22 de novembro, em Durban, África do Sul, o terceiro encontro da Conferência das Partes (COP) da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, muito bem sucedida. A COP 3 adotou diretrizes muito fortes sobre os artigos 5.3 (proteção das políticas públicas de saúde da interferência da indústria do tabaco), 11 (embalagem e etiquetagem) e 13 (publicidade, promoção e patrocínio). O desafio agora para nós, da sociedade civil, é trabalhar para assegurar a implementação dessas medidas.

Aproveitamos o momento para lançar a nossa segunda análise do status da CQCT no Brasil, e lembramos que o nosso papel é cobrar e monitorar sua implementação em nível nacional, que conclui que pouco se avançou desde a ratificação do tratado em termos de aperfeiçoamento da legislação já existente para adequação ao tratado. O relatório será lançado na próxima segunda-feira, 8 de dezembro por ocasião de evento na Academia Nacional de Medicina.

A COP também decidiu continuar trabalhando sobre o mercado ilegal e já há data para o próximo INB para discutir este protocolo, entre 28 de junho e 5 de julho de 2009, em Genebra. Também vai se trabalhar entre agora e a COP 4 nos artigos 6 (preços e impostos), 9 e 10 (regulamentação do produto e das informações), 12 (educação, comunicação, treinamento e conscientização do público), 14 (medidas de redução da demanda relativas à dependência e cessação), 17 e 18 (apoio às alternativas viáveis à fumicultura e proteção ao meio ambiente) e 19 (responsabilidade).

Entretanto, há um longo caminho pela frente nas questões sobre recursos financeiros e mecanismos de assistência para países em desenvolvimento e com economia em transição. Portanto, será preciso muito trabalho entre o momento atual e a COP 4 e também muito trabalho para a implementação das novas diretrizes aprovadas no Brasil que, lamentavelmente, ainda não conseguiu implementar nacionalmente a diretriz sobre ambientes fechados 100% livres de fumo no país, que foi uma diretriz aprovada na COP2 em julho de 2007.

Saudações sem fumaça

Paula Johns.

PERFIL

Albino Oto Gewehr

O perfil desta edição é do gaúcho Albino Oto Gewehr, 45 anos, assessor de política sindical. Apesar de já colaborar com a ACT desde que nosso nome era Rede Tabaco Zero, a partir de agora Albino estará conosco de forma mais sistemática nos temas relativos à fumicultura e no monitoramento das ações da indústria do tabaco nesta área, especialmente no sul do país.

Albino conhece bem o assunto: filho de agricultores familiares, trabalhou na área de Pesquisa & Desenvolvimento de uma empresa fumageira por quatro anos e chegou a ser fumicultor em grande escala. A entrada ‘oficial’ para o controle do tabagismo aconteceu em 1989, quando foi eleito presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Cultura do Fumo no Estado do Rio Grande do Sul (Sintrafumo-RS), entidade formada por fumicultores insatisfeitos com a cumplicidade entre indústrias do fumo, a Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra) e as federações.  “O tema tabagismo e seu controle fazem parte da minha vida desde 89, por incidir diretamente na vida das comunidades produtoras de tabaco, que cresceram assustadoramente naquele período”, explica. De 1985 a 2005, o número de famílias fumicultoras triplicou no sul do Brasil, passando de 70 mil para 200 mil.

O acompanhamento do assunto com mais atenção, entretanto, começou a partir de 1998, quando a Organização Mundial da Saúde começou a discutir o que viria a ser a Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, o tratado mundial de saúde pública, do qual o Brasil é signatário. Nota-se que a intenção de confundir o trabalhador – tática observada freqüentemente pela indústria do tabaco e seus aliados – surgiu já naquela época, como conta Albino: “As informações que chegavam para nós aqui davam conta de que seria proibida a produção do tabaco. Indústrias e Afubra disseminavam informações que não condiziam com o que os membros da OMS pretendiam e anunciavam”. Naquela época, Albino era membro do Conselho Estadual de Saúde e, em vários momentos, a contradição entre produzir fumo e os malefícios do tabaco se contrapunham nos debates. “Ao aprofundar um pouco o conhecimento sobre o setor fumageiro mundial, comecei a entender melhor a estratégia deles em relação ao Brasil”, relembra.

As multinacionais do tabaco pretendiam – e ainda pretendem – fazer do Brasil um território livre para produzir e consumir tabaco, chegando até mesmo a chamar o país de “paraíso da produção de tabaco”. Segundo Albino, aqui é o local ideal em condições climáticas, de solo e sociais para a produção, com mão-de-obra farta e barata, possibilitando a migração para cá de plantas industriais e de lavouras, que sofriam resistência no Canadá, Estados Unidos e União Européia.
 
Com a ratificação da Convenção-Quadro, houve uma grande perturbação nesses planos, pois interromperia a expansão da produção aqui, colocando em risco os estoques mundiais, uma vez que os países desenvolvidos reduzem a produção num ritmo maior que a ampliação nos países em desenvolvimento. “O debate sobre a Convenção-Quadro melhorou a compreensão sobre a conjuntura no setor e deu poder às organizações dos agricultores familiares, atrapalhando a pelegada da Afubra, Confederação Nacional da Agricultura e Contag”, conta.

Com o debate iniciado a partir do tratado internacional, ficou evidente que a região necessitava de diversificação de renda. Depois da ratificação, exemplifica, a área plantada reduziu 22%, sendo 75 mil hectares a menos com fumo. Isso fez com que o produto tivesse menos oferta, subindo a remuneração dos agricultores em torno de 30% nas últimas duas safras. No entanto, mesmo com esse incremento na renda, a área plantada não foi recuperada ainda, já que os agricultores conhecem bem a lei da oferta e da procura: se eles plantarem mais fumo, terão sua renda reduzida pelo excesso de oferta.

Para Albino, o programa de diversificação da fumicultura, lançado pelo governo federal e coordenado pela secretaria de agricultura familiar do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) é  bom, conceitualmente correto, mas carece de poder político. Ele explica: “O acordo que levou à ratificação foi provocado por uma carta compromisso, assinada por seis ministérios [Casa Civil, Fazenda, Relações Exteriores, Saúde, Agricultura e Desenvolvimento Agrário] e, na prática, só o MDA encara esse compromisso. Os outros ministérios nem dominam o tema, pelo contrário, são induzidos a erros primários pelo lobby das empresas do setor”.

O momento atual, de acordo com Albino, é de grandes desafios, que pedem ações urgentes. Uma delas é articular um grupo interministerial para implementar as ações do programa de diversificação, envolvendo os seis ministérios signatários da carta compromisso, mais os Ministérios do Trabalho e Desenvolvimento e Comércio Exterior. “Existem muitas políticas públicas que podem auxiliar a diversificação das economias locais e não será uma secretaria, de um único ministério, que enfrentará esse tema. Caso contrário, o programa morrerá de inanição e o Brasil voltará a ser o paraíso para a produção de tabaco”. Outra ação seria a implementação das ações previstas na Convenção-Quadro no que se refere ao consumo. Para encerrar, Albino é taxativo: “Convenção-Quadro não é política governamental, é política de Estado, e assim deve ser gestada pelo governo de plantão”.

ACT EM AÇÃO

NOVA ÁREA NO SITE: AÇÕES JUDICIAIS

A ACT apresenta uma nova área na biblioteca de seu site: Ações Judiciais. O conteúdo  é composto por manifestações e decisões judiciais. São fatos e argumentos que fornecem subsídios para as ações judiciais movidas contra a indústria do tabaco e expõem o que já se sabe através de consensos científicos e provas judiciais sobre suas estratégias e seu produto.  Visitem: http://www.actbr.org.br/biblioteca/acoes-judiciais.asp

ANÁLISE DAS MEDIDAS DA CQCT

A ACT participa do Fórum Tabagismo – Responsabilidade Política e Social, no Rio de Janeiro, em 8/12, (Avenida General Justo, 365, 9º andar, centro) e lança uma análise sobre a implementação da Convenção-Quadro no Brasil, onde mostra que o país pouco avançou no cumprimento das medidas, apesar da existência de alguma legislação e regulamentação em conformidade com a CQCT.

A ACT aproveita para fazer recomendações ao governo brasileiro sobre oito pontos prioritários: obrigações gerais; interferência da indústria do tabaco; preços e impostos; proteção à fumaça do tabaco; embalagem e etiquetagem; publicidade, promoção e patrocínio; comércio ilícito; e alternativas à fumicultura e proteção ao meio ambiente.

ASSEMBLÉIA GERAL

A ACT convocou seus membros fundadores, membros efetivos e demais associados para a assembléia geral ordinária, na sede em São Paulo (rua Plamplona, 724, cj, 17), às 16h do dia 9/12. Os temas a serem tratados são apresentação, exame, discussão e aprovação da Proposta de Programação Anual de Atividades, ouvido o Conselho Consultivo; apresentação, exame, discussão e aprovação do Relatório Anual de Atividades e das demonstrações financeiras do exercício findo em 2007, com relação a este último, ouvido o Conselho Fiscal; aprovação da previsão orçamentária para o exercício em curso e; eleição dos membros da Diretoria,  do Conselho Consultivo, do Conselho Fiscal e outros assuntos de interesse social.

ESCRITÓRIO NO RIO DE JANEIRO

A ACT acaba de abrir um escritório no Rio de Janeiro, localizado em Copacabana, onde ficarão a diretora-executiva, Paula Johns, a assistente de projetos, Mônica Jordão, e a diretora de comunicação, Anna Monteiro. A sede em São Paulo continua funcionando normalmente, com a vice-diretora e a coordenação jurídica.

COP 3

A diretora executiva da ACT, Paula Johns, participou da COP 3, realizada em Durban, África do Sul.

PROTESTO EM SÃO PAULO

A ACT fez um protesto, em 11 de novembro, em frente à Assembléia Legislativa de São Paulo, no Ibirapuera. O ato público foi em apoio à imediata aprovação do PL 577/2008 que proíbe totalmente o fumo em ambientes fechados.

OPORTUNIDADES

Prêmio para uso de documentos internos da indústria

O Public Health Advocacy Institute, da Northeastern University, e a Universidade da Califórnia, San Francisco Center for Tobacco Control Research and Education, estão dando um prêmio para promover usos inovadores dos documentos da indústria do tabaco. O prêmio é dado em reconhecimento a pesquisas, políticas e advocacy cujos resultados sejam tangíveis e gerem ações positivas.  O vencedor deste ano vai receber US$ 2.500,00 e será premiado durante a World Conference on Tobacco or Health, em Mumbai, entre 8 e 12 de março de 2009.

As inscrições podem ser feitas no site: www.tobaccodocumentaward.com

NOTÍCIAS

Uma névoa de falta de energia
Fonte: The Economist, 27/11/2008
 
As empresas de tabaco querem o direito de participar dos esforços globais para limitar as conseqüências letais da adição de nicotina – mas 160 governos, reunidos durante uma semana na África do Sul, disseram não.

Algumas pessoas disseram que isso seria ruim para as raposas, respondendo quando consultadas sobre o bem estar das galinhas. Mas a indústria de tabaco, que há pouco negava que seus produtos causavam tantos males, insiste que seria uma parceira legítima em cada discussão sobre como limitar os efeitos nocivos.

Numa nota, foi dito que há “um conflito fundamental e irreconciliável” entre os interesses da indústria do tabaco e a causa da saúde pública. Num conjunto de diretrizes, ficou determinado que a interação entre governos e empresas de tabaco devem se limitar ao estritamente necessário e manter a transparência por meio de audiências públicas e abertura dos arquivos. Acordos voluntários ou não passíveis de serem cumpridos devem ser proibidos. Em outras palavras, qualquer coisa que possa fazer as tabageiras parecerem cidadãs decentes, fazendo um pouco pelo serviço público, deveria ser evitado.

Essa referência a um “conflito irreconciliável” não é simplesmente uma notificação sobre o óbvio?   As tentativas ultrajantes de glamourizar o fumo nos outdoors e filmes podem ser coisa do passado, mas nos dias atuais a indústria usa táticas de polir sua imagem como um negócio que, a despeito de tudo, tem cuidado com seus consumidores. O quanto os governos dão crédito a essas novas táticas é uma questão importante.

Os críticos alegam que as empresas de tabaco, embora declarem suas preocupações com a saúde, usam métodos insidiosos para se infiltrarem e os esforços da OMS para combater a epidemia do tabaco vão por água abaixo. De acordo com eles, esta proteção é difícil de assegurar, especialmente em países com governança fraca e onde a população é pobre. Nesses locais, por exemplo, as empresas de tabaco organizam conferências, onde se discute o valor da proibição da propaganda de tabaco em tom jocoso.

E a BAT, como sempre, foi rápida em denunciar os resultados do encontro sul-africano. Ela enfatizou  o que pode ser um dos argumentos da indústria mais plausíveis em favor de ser tratada como um parceiro legítimo: a necessidade de tomar medidas severas contra o contrabando, que tende a crescer com os altos impostos recomendados pelo tratado. (...)

Aquela nuvem que passa…

Fonte: Garfolândia, 27/11/08
- Área de fumantes?
- Por favor, queiram me acompanhar até a calçada.

Nem sei se foi isso que os fumantes ouviram ao entrar no Ritz, da Al. Franca. O que interessa é que não pode mais fumar dentro do restaurante. A partir de hoje, o Ritz é “smokefree”. Querem saber a minha opinião? Gostei. Não fumo e posso afirmar que é horrível engolir fumaça com a comida (amigos fumantes, desculpem a sinceridade).
Sei que a medida vai gerar polêmica. Principalmente porque se trata de um lugar híbrido, festivo, com clima de bar e uma vibe de reunião entre amigos. Imagino que isso tudo inspire uma vontade danada de dar uma tragada. Mas também conheço gente que fuma e, na hora de escolher uma mesa, corre para a ala de não-fumantes. Ou seja, é evidente que fumaça incomoda. E no Ritz dos Jardins, vamos combinar… era cruel demais para os que fugiam da nuvem branca e mal cheirosa.
A área de não-fumantes ficava espremida no mezanino, perto da cozinha.
Por favor, não pensem que estou fazendo campanha anti-tabagismo. Nada disso. Cada um tem o direito de se entregar aos prazeres que bem entender. Só levanto a bandeira de um dos regulamentos das leis municipal e federal que permite o cigarro “em área destinada exclusivamente a esse fim, devidamente isolada e com arejamento conveniente”. Não era o caso do Ritz, da Franca. Na filial da rua Jerônimo da Veiga, embora maior, a nova regra também vale. A diferença é que lá você pode acender o cigarro numa área aberta, mais agradável, instalada nos fundos do salão principal.
Isso é assunto que vai dar muito pano pra manga. E você, o que acha heim?

BAT teme explosão do contrabando de tabaco
Fonte: Times Online, 25/11/2008


A British American Tobacco fez uma advertência sobre as novas diretrizes anti-tabagismo da Organização Mundial da Saúde. Segundo a empresa, elas podem levar a um aumento do contrabando.

Entre as medidas acordadas entre os 160 delegados que estiveram reunidos na África do Sul, estão a limitação e transparência da interação entre governos e a indústria do tabaco, a proibição de qualquer display de produtos de tabaco em lojas e a possibilidade de que seja adotada a embalagem genérica para os produtos de tabaco.

O executivo da BAT, Paul Adams, disse que muitas das diretrizes sugeridas no encontro da OMS podem minar as tentativas de reduzir o impacto do fumo à saúde e levar a um aumento grande do comércio de produtos ilegais: “Concordamos inteiramente que a fabricação, distribuição e venda de produtos de tabaco devem ser reguladas. Mas essas diretrizes nos levam a questionar se são as melhores práticas. Elas têm um potencial de denegrir e marginalizar um negócio legítimo, que paga impostos, e é regulamentado”.  (...) Ele acrescenta: “A indústria legítima pode ajudar a impedir a venda ilegal para crianças, lutar contra o comércio ilícito, criar padrões para o marketing apropriado, investe em pesquisas sobre produtos menos perigosos – e também apoio milhares de empregos e paga impostos, especialmente em tempos de dificuldades econômicas”.

Comentário ACT: Um argumento plausível e até convincente para quem não conhece o envolvimento da própria indústria em grandes esquemas de contrabando. Há que se ter muito cuidado nessa seara, um tema complexo e cheio de brechas perigosas. Precisamos de uma aplicação eficiente do artigo 5.3 e não perder de vista que a indústria do tabaco não pode ser parceira nesses esforços, deve ser regulada.

COMISSÕES / Direitos Humanos
Agência Senado - 27/11/2008  

Enquanto existir a liberdade de consumo do cigarro, é necessário proteger as pequenas indústrias de fumo espalhadas por todo o país e que empregam milhões de brasileiros, afirmou o senador Sérgio Zambiasi (PTB-RS), durante audiência pública realizada pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) que reuniu cinco representantes de empresas fumageiras.

O senador informou que as dificuldades por que passam as pequenas indústrias agravam-se com o fato de o Brasil ser signatário de um convenção-quadro internacional que proíbe o plantio de  fumo em solo brasileiro.  Mas observou que a convenção prevê incentivos para que o plantio do tabaco seja trocado por outra cultura, como a de milho, arroz ou feijão.

Zambiasi admitiu que a situação do fumo é complexa, porque envolve duas questões primordiais: o agravamento da saúde da população que fuma e o aprofundamento do problema social, já que a cadeia produtiva do fumo emprega milhões de pessoas.

Os representantes das empresas de tabaco que tomaram parte da reunião pediram ao governo, entre outras providências, nova sistemática de tributação para os cigarros, com destaque para o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI); combate ao contrabando de cigarros, especialmente os oriundos do Paraguai; proteção aos trabalhadores da cadeia produtiva do fumo, algo em torno de 2,5 milhões de pessoas; e a redução da assimetria do poder econômico entre as duas multinacionais do setor - Souza Cruz e Philip Morris - e as pequenas indústrias nacionais.

Comentário ACT: Ter que ouvir que a CQCT proibe o plantio de fumo em solo brasileiro vindo de um senador que acompanhou de perto as negociações sobre a ratificaçao do tratado parece brincadeira de mal gosto.

Contrabando
O presidente do Sindicato da Indústria do Fumo do Estado de São Paulo (Sindifumo), José Henrique Nunes Barreto, solicitou ao governo maior incentivo às empresas de tabaco no país. Segundo ele, as indústrias nacionais, que, observou, atualmente não passam de uma dezena, representando em torno de 8% do mercado com a venda de produtos populares e de menor preço, estão sufocadas pelas duas gigantes multinacionais.
José Henrique denunciou o que chamou de flagelo do contrabando mundial de cigarros, organizado, segundo ele, por grandes corporações européias e norte-americanas "diante da desorganização do aparato repressivo dos governos". (...)

Artur Bueno de Camargo, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação (CNTA), que também participou da audiência pública proposta pelo senador Paulo Paim (PT-RS), informou que, somente no campo, a agricultura familiar que planta fumo emprega mais de 900 mil pessoas.
Aristides Junqueira Alvarenga, representante da Ética Concorrencial (ETCO), pediu plena concorrência na venda de cigarros para que o pagamento do IPI seja efetuado por todas as empresas.  (...)

Comentário ACT: Preparemo-nos: o Sindifumo, que está sendo re-batizado de SindiTabaco, está fazendo mega investimentos em campanhas de RP para melhorar sua imagem junto a formadores de opinião, legisladores, etc. Em termos práticos isso significa mais oposição às medidas de saúde pública.

Ex-fumante ganha ação contra Souza Cruz
Fabricante de cigarro é condenada em 2.ª instância a pagar R$ 600 mil
Fonte: O Estado de S. Paulo, 14/11/2008

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo condenou a fabricante de cigarros Souza Cruz a indenizar em R$ 600 mil a ex-fumante Maria Aparecida da Silva, que fumou por 30 anos, sofre de tromboangeíte aguda obliterante (TAO) e amputou as pernas por causa da doença, associada ao tabagismo. Esta é a segunda decisão do País em que a Justiça entende que, independentemente da comprovação de que tem culpa pelo dano, as fabricantes de cigarro respondem pelos malefícios causados ao consumidor.

O novo entendimento anima ativistas e integrantes do Ministério Público que defendem processos contra a indústria do fumo. “A Justiça, tradicionalmente, vinha entendendo que a culpa era sempre do fumante. Agora foi diferente. Nessa decisão o Tribunal adotou princípios do Código de Defesa do Consumidor e do Novo Código Civil, de 2002, que responsabilizam as empresas por quaisquer danos decorrentes do consumo de seus produtos, sem maiores questionamentos. Por isso, é um precedente muito importante”, opina o promotor João Lopes Guimarães Júnior, que não participou da ação individual, mas atualmente move ação civil pública contra as empresas.

A Souza Cruz, que já havia perdido na primeira instância, informou que vai recorrer da ordem, datada do início de outubro. Pela decisão, terá de pagar também por atendimento médico, próteses e pelos anos que a ex-fumante deixou de trabalhar em razão dos danos à saúde causados pelo fumo.

A Aliança de Controle do Tabagismo comemorou a confirmação da condenação. “A decisão torna-se um marco para o controle do tabagismo na área jurídica, pois os votos vencedores citaram, ainda, a publicidade enganosa e abusiva da indústria, os baixos preços do cigarro praticados no Brasil e documentos internos da indústria do tabaco, que demonstram sua estratégia coordenada e global para dissuadir consumidores, governo e opinião pública”, destaca comunicado da entidade.
(...)

IRRESPONSABILIDADE SOCIAL

Confira a edição nº41 da Revista Diálogo
Fonte: Souza Cruz, novembro 2008
A revista Diálogo deste mês publica uma entrevista exclusiva com o ex-secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, que critica os rumos da reforma tributária e alerta para as conseqüências da tributação excessiva.
Uma interessante reportagem revela os 90 anos de sucesso do Sistema Integrado de Produção de Fumo, que beneficia mais de 40 mil produtores. (...)
       
Outro destaque da edição é a dupla condecoração da Souza Cruz, em São Paulo. Na mesma noite de 20 de outubro, a empresa recebeu os troféus Melhores do Agronegócio (revista Globo Rural)  e Balanço Anual 2008 (jornal Gazeta Mercantil). (...) Já em Uberlândia, o gerente de Meio Ambiente, Edson Dorigon, representou a empresa na premiação do 6º Benchmarking Ambiental Brasileiro, que ocorreu em setembro.

A Diálogo acompanhou ainda o ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi, que visitou a fábrica da Souza Cruz em Cachoeirinha. A Diálogo esteve em Brasília e entrevistou os líderes do PT, Maurício Rands e do PSDB, José Aníbal, que fizeram uma análise dos resultados das últimas eleições. (...)

 

Comentário ACT

A Souza Cruz foi pródiga em misturar tantos assuntos relevantes numa única edição, fazendo sua leitura muito própria deles. Por isso, achamos útil mostrar o ‘outro lado’ da história.

O ex-secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, repete o discurso da indústria, ao dizer que o contrabando vai aumentar. Ele vai além, dizendo que controlar o consumo de determinados produtos por meio de uma carga tributária elevada seria de fundo quase religioso e um equívoco, pois produz ilegalidade. No entanto, ele esquece de mencionar alguns fatos: o cigarro brasileiro está entre os seis mais baratos do mundo e a política tributária brasileira tem favorecido a queda do preço real e a manutenção das receitas líquidas das grandes companhias de tabaco, registrando-se, inclusive, redução da arrecadação real do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre o cigarro.  Sobre o contrabando aumentar com a elevação de impostos, Maciel simplesmente cita dados da indústria, pois falta levantamento dos números do comércio ilegal através de outras fontes.

Sobre os 90 anos do sistema integrado de produção, a revista da Souza Cruz mente ao dizer que ele beneficia 40 mil produtores. Exatamente há um ano, entrevistamos o representante da ACT em Brasília, que disse: a integração leva o agricultor a uma inclusão perversa.

Nesse sistema, as fumageiras garantem a compra da totalidade do fumo plantado pelo agricultor e existe uma tabela de preços definidos para cada classe de folha, determinada individualmente para cada agricultor nas instalações das indústrias. Não há muito critério nisso, a não ser aquele que Guilherme chama de endividamento programado, em que os fumicultores compram um pacote tecnológico (sementes, agrotóxicos, fertilizantes, em síntese, insumos e implementos agrícolas necessários para o plantio) com financiamento direto ou avalizado pelas fumageiras, e como a classificação do fumo é rebaixada na hora da comercialização, ele acumula dívidas para os anos seguintes. Ou seja, ele fica vinculado pela dívida a seguir plantando fumo para aquela mesma empresa.  Caso consigam alguém que pague melhores preços, é comum sofrerem o aresto judicial.  Além disso, é comum crianças trabalharem na época da colheita, como foi denunciado em   processo judicial pelo Ministério do Trabalho – inclusive contra a Souza Cruz -- e em matéria do Fantástico, que você pode assistir aqui: http://www.actbr.org.br/biblioteca/videos-conteudo.asp?cod=6

Quanto ao prêmio de benchmarking ambiental, dado pelo Instituto de Engenharia de Uberlândia à fábrica da Souza Cruz na cidade mineira, é lamentável.  A lavoura do fumo é uma das mais nocivas à saúde do agricultor, que contrai diversas doenças ao manipular agrotóxicos, e uma das mais agressivas ao meio ambiente, justamente por conta dos produtos químicos e da queima de carvão para a cura da folha do tabaco. Na COP 3, realizada em novembro na África do Sul, foram discutidos os artigos 18 e 19, sobre alternativas à fumicultura e proteção ao meio ambiente. É inacreditável que qualquer instituto sério nesta área de um prêmio de meio ambiente a qualquer empresa de cigarro.

Por último, vemos mais uma vez políticos, como o ministro Carlos Lupi e os deputados José Aníbal e Maurício Rands mantendo relações com a indústria. Também na COP3 foram discutidas medidas para prevenir a interferência da indústria do tabaco em assuntos governamentais, um dos maiores obstáculos para a implementação de medidas de controle do tabaco comprovadamente eficazes. O Ministério do Trabalho faz parte da Comissão Interministerial para Implementação da Convenção-Quadro. Os deputados vão votar o projeto de modificação da lei federal 9194/96, que proíbe o fumo em ambientes fechados, sem exceções, entre outros na área de controle do tabagismo. Ou seja, não deveriam ter qualquer tipo de contaminação com essa indústria, mas ao contrário, estar muito bem atentos sobre suas estratégias para atrasar políticas públicas de controle do tabaco.

Ficha Técnica

Realização: ACTbr - Aliança para o Controle do Tabagismo
Apoio: HealthBridge - CIDA - IUATLD – TFK
Jornalista responsável: Anna Monteiro - anna.monteiro@actbr.org.br