Jogo de Palavras

01.02.18


Folha de S. Paulo

fábrica da Philip Morris na Suíça

MÔNICA ANDREIS E VALESKA FIGUEIREDO

Neste início de 2018 a Philip Morris anunciou uma nova resolução de ano novo: assim como muitos fumantes o fazem todos os anos, agora seria a vez deles de tentar desistir dos cigarros.

Essa é uma poderosa declaração vinda da gigante indústria de fumo, que produziu o efeito desejado e repercutiu em todo o mundo. Não é de hoje que se conhecem a extensão dos males causados pelo tabagismo e a dificuldade que o fumante tem para parar de fumar, uma vez instalada a dependência do produto.

A maior parte dos tabagistas começa a fumar na adolescência e, em pouco tempo, torna-se dependente da nicotina, permanecendo assim ao longo de boa parte de sua vida adulta. A decisão de parar não é fácil e exige persistência.

Quando alguém comunica à família e aos amigos que fez essa resolução para o ano novo, todos celebram juntos e esperam que a tentativa ocorra em breve. Mas não podemos esperar o mesmo da Philip Morris.

Apesar do anúncio bombástico, seus representantes têm repetido que se trata de uma mudança a longo prazo, e que não vão deixar o ramo do tabaco. Dizem querer investir e ampliar a comercialização de novos produtos, alegando que estão preocupados com a saúde de seus consumidores e buscam alternativas menos danosas.

Mas, se eles estão realmente preocupados com a saúde, por que continuam a contestar medidas de controle do tabaco na Justiça? Por que continuam promovendo cigarros para o público infanto-juvenil, posicionando-os perto de balas e doces nos pontos de venda e adicionando sabores e aromas?

O uso de aditivos em cigarros potencializa a ação da nicotina e a absorção de substâncias tóxicas, além de atrair jovens para o consumo, pois os sabores mascaram o gosto ruim dos primeiros cigarros. Nos últimos anos, o registro de marcas de cigarros saborizados cresceu 1.900%. Retirar os aditivos é uma medida eficaz que pode ser adotada já, mas esta a Philip Morris prefere não mencionar.

Vale lembrar que no passado os cigarros light foram alardeados como opções mais seguras para o consumo, e isso se revelou uma grande mentira: milhões de pessoas foram enganadas. É preciso muita cautela com esse novo discurso da indústria do fumo, que busca se restabelecer e reinventar um mercado em declínio.

Em várias entrevistas, representantes da empresa mencionam que a Philip Morris fará uma mudança gradual e não imediata dos cigarros convencionais para os novos dispositivos de fumar. Por que pressionam, então, para que seu novo produto, ainda com sérias controvérsias na comunidade científica, seja imediatamente aceito pelas autoridades sanitárias do país?

Temos visto que grupos de interesse têm exercido forte pressão para que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) libere a comercialização desses produtos no Brasil, apesar de não haver evidências conclusivas sobre seu impacto na saúde a médio e longo prazo.

Usar um discurso aparentemente pró-saúde para seduzir o público não condiz com as atitudes que a empresa ainda mantém quando se trata da defesa de seus interesses comerciais. É necessário muito mais do que um discurso sedutor para mitigar o dano causado pela indústria do tabaco à população brasileira e mundial.

MÔNICA ANDREIS, psicóloga, é diretora-executiva da ACT (Aliança de Controle do Tabagismo) Promoção da Saúde VALESKA FIGUEIREDO é coordenadora do Centro de Estudos Sobre Tabaco e Saúde, da Escola Nacional de Saúde Publica (Fundação Oswaldo Cruz).




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