CHANCE HISTÓRICA DE A JUSTIÇA MUDAR A FORMA QUE A INDÚSTRIA DO TABACO COLOCA SEU PRODUTO NO MERCADO

Os desembargadores da 7ª Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo vão decidir se é devida a
reparação de danos a consumidores de cigarros e ex-fumantes, em julgamento marcado para o dia 28 de
janeiro de 2015.
A ação foi proposta pela Adesf – Associação de Defesa da Saúde dos Fumantes, contra Souza Cruz e
Phillip Morris, visando à condenação das empresas por danos patrimoniais e morais sofridos por
fumantes e ex-fumantes de cigarros, pela omissão em informar que a nicotina causa dependência física
e psicológica do cigarro, bem como pela publicidade enganosa e abusiva que induziram as pessoas a
fumar cigarros.
Durante o processo, as empresas rés se valeram de todos os artifícios e subterfúgios processuais para
obstaculizar o regular andamento da ação.
O julgamento em questão é do recurso da Adesf contra a sentença que julgou a ação improcedente.
Eventual decisão favorável à Adesf neste julgamento será capaz de mudar a forma com que as empresas
fabricantes de cigarros colocam seus produtos no mercado, pois sabendo que podem ser responsabilizadas
por danos causados a seus consumidores, certamente vão lhes levar informação adequada, além daquelas
exigidas pelo poder público, e pensarão duas vezes antes de fazer publicidade abusiva e enganosa.
Destaca-se o fato inédito de ser a primeira ação coletiva no país a se conseguir
a inversão do ônus da prova, ou seja, o ônus de provar que a nicotina não vicia e que a
publicidade não influencia o consumo é das empresas fabricantes do cigarro, e não dos consumidores.
Foram produzidos dois excelentes laudos periciais.
Em resumo, a perícia médica traz histórico da evolução das pesquisas científicas
com relação à dependência ao fumo e à nicotina, bem como com relação ao tabagismo como fator causal e
de risco para várias doenças, e a perícia da publicidade comprova a influência da publicidade no consumo
de cigarros.
Os laudos periciais confirmaram que o cigarro causa dependência e impõe riscos à saúde,
e que tais fatos são conhecidos há tempos pelas empresas rés. Contudo, as empresas nunca
inseriram em sua embalagem e publicidade informações sobre o produto cigarro. As mensagens e imagens
de advertência contidas nos maços e publicidade são fruto de determinação legal e realizadas pelo
Ministério da Saúde.
Além de nunca terem informado seus consumidores sobre os malefícios do cigarro,
as empresas contestam na Justiça a obrigatoriedade do uso das imagens e mensagens de advertências.
E ainda, para se isentar de indenizar seus consumidores pelos danos do tabagismo, alegam que informam os
riscos do tabagismo ao estampar as imagens e mensagens de advertência nos maços. É preciso que o Judiciário
esteja atento para esta postura desleal das fabricantes de cigarros.
A perícia comprovou que quase 80% dos fumantes começou a fumar antes dos 18 anos,
e que nem todos consumidores estão bem informados quanto ao risco e consequências futuras do
tabagismo ao iniciarem o consumo.
A perícia ainda evidenciou que em diversas peças de propaganda de cigarros o
público alvo são os jovens, e que os riscos à saúde associados ao consumo de cigarros e a
dependência da nicotina foram mundialmente minimizados de forma sistemática pela indústria de cigarros,
de forma que a informação que chegou à sociedade brasileira não foi unívoca.
Apesar das provas técnicas produzidas terem dado suporte à pretensão da autora,
surpreendentemente, a sentença acabou por decidir em sentido contrário a esta, julgando
improcedente a ação, em maio de 2011. A juíza considerou ser fato notório, há décadas, que o
cigarro é prejudicial à saúde do fumante, e que as empresas já informam sobre os malefícios do
fumo ao cumprirem a lei ao estampar as advertências nos maços de cigarros, determinadas pelo
Ministério da Saúde.
A Adesf apresentou recurso ao Tribunal de Justiça de São Paulo,
que deverá ser julgado em 28 de janeiro 2015.
O Ministério Público se manifestou no processo e concluiu que está evidenciado
que as empresas tinham pleno conhecimento do defeito do cigarro e omitiram, deliberadamente,
informações relevantes e essenciais relativas à composição e ao alto grau de
nocividade do produto cigarro que oferecia e colocava no mercado de consumo,
concluindo que houve inequívoca violação aos princípios jurídicos básicos, como a boa-fé
objetiva, o respeito à vida e saúde humana, a transparência e informação.
Não será a primeira vez que este Tribunal julga a responsabilidade civil de
fabricantes de cigarros, e espera-se que os desembargadores sigam a mesma linha de
entendimento adotada anteriormente em causas análogas, em que acertadamente reconheceu a
responsabilidade civil destas empresas, condenando-as a ressarcir
os danos causados aos seus consumidores.
Links para acesso a outras decisões:
www.actbr.org.br/uploads/conteudo/172_SP2608284000merito.pdf
www.actbr.org.br/uploads/conteudo/173_SP3792614500merito.pdf
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