OS DESAFIOS DO CONTROLE DO TABAGISMO NO BRASIL – CRISTINA PEREZ
A epidemia do tabagismo continua forte. O número de fumantes no mundo chega perto de um bilhão de pessoas, segundo artigo publicado no Journal of American Medical Association (JAMA), divulgado no início do ano.
No Brasil, graças às políticas de controle do tabaco, o número de fumantes caiu quase pela metade nos últimos 20 anos, indo de 32%, em 1989, para 17,2%, em 2008, segundo a Pesquisa Especial sobre Tabagismo (PETab), do Ministério da Saúde. Em 2013, de acordo com o Ministério, o percentual de fumantes passou para 12% da população e a meta é chegar a apenas 9% de fumantes. Apesar do sucesso das medidas adotados pelo Brasil, que serve de modelo para vários países nesta área, ainda há muito a ser feito para que a queda seja contínua.
A psicóloga do Instituto Nacional de Câncer (Inca) e consultora da Fundação do Câncer, Cristina Perez, fala sobre os principais desafios e quais as políticas de saúde eficazes para levar o fumante a parar.
O número de fumantes caiu no Brasil em 20 anos. Quais as principais políticas públicas de saúde que contribuíram para isso?
Cristina Perez: O fator que contribuiu para isso foi a implementação das políticas de controle do tabaco durante este período. Não podemos definir somente uma ação como responsável, mas um conjunto delas como o aumento do preço dos cigarros, as leis de ambientes livres do fumo, as restrições de propaganda de cigarros, as advertências sanitárias nas embalagens, entre outras.
A adoção de todas essas ações de forma organizada torna o ato de fumar menos natural e aceito. Elas servem para mostrar os reais efeitos prejudiciais para a saúde de todos e possibilitam aumentar o conhecimento da população sobre os riscos de se fumar, conscientizando assim fumantes e não fumantes.
O que o Brasil precisa adotar para reduzir para 9% o número de fumantes, meta anunciada em 2013 pelo Ministério da Saúde?
CP: O Brasil é modelo no controle do tabaco para vários países, mas pode continuar avançando através da intensificação das ações já adotadas como o aumento ainda maior dos impostos sobre os cigarros, maior vigilância na restrição de acesso aos produtos do tabaco por crianças e adolescentes, expansão da oferta do tratamento do fumante na rede SUS e principalmente a publicação da regulamentação da Lei 12.546/11. Essa lei possibilita a adoção da proibição total de fumar em locais públicos e fechados no Brasil e a propaganda de cigarros nos pontos de venda. Se essas políticas forem intensificadas, a contribuição relativa na queda da prevalência de fumantes pode aumentar de forma significativa.
Quais são os principais desafios para o controle do tabagismo?
CP: Atualmente temos dois grandes desafios no controle do tabaco que precisamos vencer com urgência. O primeiro é a regulamentação da Lei 12.546 que foi publicada em dezembro de 2011 e até o momento não ocorreu. Com esta regulamentação, a proibição total de fumar em locais públicos e fechados no Brasil será estabelecida, assim como a proibição da propaganda de cigarros nos pontos de venda. A publicação desta regulamentação permitirá que a Vigilância Sanitária fiscalize e autue os estabelecimentos que não estivem em conformidade com a Lei.
Outro ponto muito importante é a urgente votação da ação que atualmente tramita no Superior Tribunal Federal com o objetivo de derrubar a resolução publicada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para proibir os cigarros com aditivos.
Os cigarros com sabores são piores para a saúde?
CP: Estudos científicos comprovam que os cigarros com sabores têm a específica função de mascarar o gosto ruim durante a fase de experimentação, ou seja, melhorar a sensação e o sabor dos primeiros cigarros.
Vale ressaltar que esta experimentação ocorre principalmente entre os jovens, que vêm a ser o público alvo das companhias de cigarros. Dados da pesquisa Global Youth Tobacco Survey – Brazil, conduzida em 10 capitais brasileiras, com 13.518 estudantes de 13 a 15 anos, mostram que 44% dos estudantes de ambos os grupos estudados disseram fumar cigarros com sabores.
Fica claro que os fabricantes de cigarros querem manter a alta iniciação do tabagismo entre os jovens abrindo o caminho para a dependência à nicotina se instalar e tornar seu público alvo novos consumidores regulares.
Esperamos que os Ministros do STF não permitam que os cigarros brasileiros continuem sendo fabricados com sabores como morango, baunilha ou chocolate e assim seja possível proteger os adolescentes do tabagismo, uma doença que mata um em cada dois fumantes regulares.
O que o fumante deve fazer para parar de fumar? Quem ele deve procurar?
CP: Deixar de fumar não é fácil, pois a dependência da nicotina é composta por um conjunto de fenômenos comportamentais, cognitivos e fisiológicos. Muito poucos fumantes conseguem parar de fumar com sucesso em sua primeira tentativa, por isso não desistir é fundamental.
Todo profissional de saúde deve perguntar ao paciente se ele fuma e, no caso de ser um fumante, deve estimular a cessação de fumar. Segundo a Organização Mundial da Saúde, mesmo o breve aconselhamento de profissionais de saúde pode aumentar as taxas de abstinência de tabaco em até 30%. Intervenções para a cessação de fumar lideradas por enfermeiros têm mostrado que podem aumentar a chance de parar de fumar com sucesso em até 50%.
No Brasil, algumas unidades de saúde do SUS foram capacitadas para oferecer tratamento para deixar de fumar e medicamento quando necessário. Os fumantes interessados podem se informar sobre os locais para tratamento nas Secretarias de Saúde do seu estado.
Outra ferramenta disponível é o Disque Pare de Fumar, serviço que oferece informações gerais sobre tabagismo e apoio para a cessação de fumar através do telefone 136. |