EDITORIAL



No Brasil, mais da metade da população tem excesso de peso (56,9%), de acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde, do IBGE, o que equivale a cerca de 82 milhões de pessoas com 18 anos ou mais, e a obesidade já atinge mais de 20% da população.  São vários os estudos que comprovam que a obesidade é um importante fator de risco para diversas doenças crônicas não transmissíveis, como colesterol, hipertensão arterial, infarto agudo do miocárdio, diabetes tipo 2, síndrome metabólica, alguns tipos de câncer (incluindo mama, ovários, endométrio, próstata, rim e cólon). O Ministério da Saúde identificou um crescimento de mais de 60% da diabetes em dez anos, de 2006 a 2017.   

Uma das medidas recomendadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para a redução da obesidade e das doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) é o aumento de tributos sobre bebidas açucaradas, como os refrigerantes e os sucos de caixa, a exemplo do que foi feito com os produtos de tabaco para reduzir a taxa de fumantes. Com os preços mais altos, a tendência é que o consumo caia, assim como os problemas causados por esse tipo de produto.

Mas o Brasil insiste em ir na contramão das evidências. No dia 1o, decreto presidencial publicado no Diário Oficial mudou as alíquotas de IPI das empresas que produzem xarope de refrigerantes e outras bebidas, instaladas na Zona Franca de Manaus. Assim, elas têm direito a mais crédito e pagam menos impostos. A conta das doenças associadas à ingestão de açúcar vai para os cofres públicos. O próprio Ministro da Saúde disse que não sabia do decreto, mas afastou o risco de aumento da obesidade e outras doenças e repetiu o que é dito pelas companhias quando se debate a questão: tudo se resolveria com educação e atividade física.

Não é bem assim. Problemas causados em ritmo industrial não serão resolvidos com soluções individuais. A indústria de bebidas gasta bilhões de dólares no mundo todo com propagandas destinadas a influenciar as pessoas a comprarem seus produtos. Como as empresas de tabaco sempre fizeram. Depois, dizem que a culpa é dos consumidores por não ter autocontrole.  Esse discurso de jogar o problema para o colo do indivíduo e não investir em saúde pública é esclarecido no livro Uma Verdade Indigesta, de Marion Nestle, tema da nossa edição anterior.  Damos mais detalhes sobre o tema na seção Notas.

“É preciso estar atento à submissão do Estado à força dos mercados, o dogma do capitalismo liberal e neoliberal, que evita regulação”. É sobre isso que gira a conversa com o economista Claudio Fernandes, na seção Entrevista. Experiente em tritutação de produtos que fazem mal à saúde, ele comenta sobre a falta de vontade política dos governos em implantar a Agenda 2030 de desenvolvimento sustentável, o que significa mudar alguns paradigmas, entre eles o de mercado. Claudio também analisou o estudo intitulado "Uma alternativa de combate ao contrabando a partir da estimativa da curva de Laffer e da discussão sobre a política de preço mínimo", de Pery Shikida, Mario Margarido, e Matheus Nicola, que questiona a política bem-sucedida de preços mínimos para cigarros, adotada pelo Brasil. Os autores usaram dados de 2015 do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social da Fronteira (Idesf), que vem fazendo estudos sobre mercado ilegal mas não apresenta sua metodologia de pesquisa. A Souza Cruz afirma, em seu website, que o Idesf é um de seus parceiros estratégicos.

A aprovação do Projeto de Lei 769/15, chamado antifumo, no Senado, no último dia 3, foi um motivo de comemoração. Ele proíbe totalmente a propaganda de cigarros em pontos de venda, o uso de aditivos de sabor e estabelece como infração o ato de fumar em veículos com menores de idade e gestantes, além de aumentar as advertências sanitárias. O texto original tinha  como proposta o uso de embalagens padronizadas, mas a relatora Leila Barros alegou problemas constitucionais. Na seção ACT Legal mostramos a constitucionalidade da medida, que vem sendo adotada em vários países.

Damos destaque, também, à audiência que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária promoveu, em junho, sobre novos produtos para fumar. Como sabemos, há uma pressão forte da indústria do tabaco para que os dispositivos de fumar, como cigarros eletrônicos e outros, sejam liberados no país, embora faltem estudos conclusivos sobre sua eficácia. Devemos destacar que a comunidade de saúde pública lembra que, diante da redução da demanda por tabaco no mundo e dos bons índices de redução de prevalência de fumantes no nosso país, há forte risco de que a liberação desses dispositivos represente a abertura de um novo mercado de produtos fumígenos, o que seria de grande impacto na saúde pública.

E então, voltamos à lógica do mercado, que quer impor seus produtos ao consumidor, mesmo que isso custe bilhões aos cofres públicos em tratamentos. É esse o crescimento que queremos? Com uma população adoecida?

Boa leitura.

Anna Monteiro
Diretora de Comunicação
ACT Promoção da Saúde




ENTREVISTA COM CLAUDIO FERNANDES



Parar de tapar buracos e de subsidiar o que causa problemas à sociedade como um todo. Esse é um dos desafios que o economista Claudio Fernandes vê para a implementação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, as metas que estão previstas na Agenda 2030, das Nações Unidas. Os outros desafios esbarram na falta de vontade política do governo federal em mudar paradigmas econômico, social e ambiental e submeter o Estado à força dos mercados. Claudio é economista do desenvolvimento com experiência em sustentabilidade, finanças públicas, tributação e financiamento. Na Entrevista, ele fala sobre alguns temas de trabalho constantes da ACT Promoção da Saúde e da Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável, como a tritutação de produtos que causam danos, como cigarros e bebidas açucaradas.

O Ministério da Justiça e Segurança Pública surpreendeu a comunidade de saúde pública sugerindo estudar a proposta de baixar impostos de cigarros para conter o contrabando. Do ponto de vista da economia, qual sua opinião sobre isso?

Acho um contrassenso. Vai de encontro às evidências materiais que mostram que o combate ao mercado ilícito é feito com fortalecimento do aparato de segurança pública. Países que tentaram essa medida de redução de impostos observaram que não havia relação direta entre preço e contrabando, especialmente porque o aumento de preços praticado pela indústria é maior do que o aumento provocado por tributos. O roteiro correto está no Protocolo de Combate ao Mercado Ilícito de Cigarros, parte da Convenção Quadro para o Controle do Tabagismo, desenvolvidos pela Organização Mundial da Saúde e ratificados pelo Brasil.

Aqui cabe uma nota importante. Quando uma Convenção é aprovada em um órgão de política multilateral, ela passou por um processo rígido de validação científica e econômica. A OMS escutou desde peritos de medicina ao Banco Mundial, representantes de diversas partes interessadas em encontrar solução para o mal maior, o tabagismo e suas consequências para a saúde da população. Portanto, ir de encontro a um consenso político e científico não é outra coisa senão um contrassenso.

A ACT encomendou um estudo a economistas sobre a análise feita sob encomenda do Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras, Idesf, que baseou a criação do grupo de trabalho do Ministério da Justiça. Segundo esses economistas, o texto não seria robusto. Poderia falar um pouco a respeito? Lembrando que o Idesf é considerado parceiro estratégico da Souza Cruz, descrito como tal no site da empresa.

O estudo do Perry Assis Shikida, que foi citado na criação do GT para estudar baixar impostos, é o que se pode considerar, no meio científico, como rigoroso porém inexato. Seu escopo de observação é limitado, seus cálculos econométricos são restritos a condições estáticas na economia, que é dinâmica, e sua premissa é enganadora e descontextualizada, pois não considera diversos dados importantes para formar um quadro analítico que tenha alguma validade na vida real.

Ele parte de um princípio hipotético, baseado na Curva de Laffer, uma tese generalista para o comportamento agregado da macroeconomia, adapta para uma situação de microeconomia, e busca confirmar a validade dessa curva para o mercado de cigarros no Brasil. Além disso, trata o comportamento do consumidor como algo geral para todas as classes sociais, o que é inconcebível, pois se sabe do contingente de fidelidade à marca associado ao ato de fumar, algo que é trabalhado pelo próprio marketing da indústra do cigarro. Portanto, eu seria um pouco mais rígido e diria que o estudo do Shikida é inválido do ponto de vista material.

No entanto, esse estudo ganhou um prêmio do Conselho Estadual de Economia do Paraná. Para uma disciplina que continua sendo ensinada nas universidades sob premissas de que "em considerando todas as outras condições constantes", não é de surpreender a disjunção entre certas teorias e a realidade múltipla da economia.

O estudo usa o conceito da curva de Laffer. O que significa esta tese?

Arthur Laffer, economista americano recentemente laureado com a Medalha do Mérito pelo Presidente Donald Trump, propôs a simples tese baseada em uma parábula em formato de sino. Ele afirmou que se o Estado tributasse zero, arrecadaria zero, mas se tributasse 100%, também teria zero de receita, pois as pessoas buscariam escapar da fiscalização através da economia informal, dinheiro vivo (evitando bancos) e mercados ilícitos.

Em seu esquema, ele propunha uma política tributária agregada que permitisse que indivíduos e empresas tivessem mais recursos em mãos para mover a roda da produção e consumo. Daí surgiu o que depois ficou conhecido como "reaganomics", pois o Presidente Ronald Reagan praticou essa tese. Fica comprovado pela História que nem em termos macroecoômicos a tese de Laffer é válida, pois o motor da economia de oferta de moeda estimula o sistema financeiro às custas do alto endividamento do Estado.

Portanto, usar essa tese para um mercado específico, como o cigarro, que tem o próprio vício causado pela substância como algo a ser analisado por estudos consistentes, não apresenta qualquer validade científica, apenas alimentando uma narrativa de "falsa consciência".

E como foi usada no caso dos cigarros e o mercado ilícito?

A premissa apresentada para a criação do GT para estudar a redução de impostos sobre o cigarro é a de que o preço estaria alto e isto estaria estimulando indiretamente o contrabando de cigarros mais baratos (aquilo que Laffer apontou como alternativa para burlar o fisco). Esta é uma premissa falsa, acompanhada de uma narrativa enganadora.

Primeiro, o cigarro no Brasil é barato quando comparado a países de mesmo nível de renda per capita. O fumante Brasileiro tem, em relação ao cigarro, o poder paritário de compra de um fumante na Itália, país desenvolvido com maior nível de renda.

Segundo, os cigarros contrabandeados fazem parte de apenas um segmento de mercado, o do produto mais barato. Não há contrabando de cigarros de maior valor agregado. Portanto o contrabando afeta mais os fumantes mais pobres, o que corresponde a apenas um terço do mercado total de cigarros no país.

Daí se deduz que há um interesse da indústria em influenciar políticas públicas através de ideias criadas que não correspondem à verdade, ou ideias espúrias. Mentem com números. Por exemplo, anunciam que o contrabando teria quase 50% do mercado de cigarros no Brasil. Como seria isso se quem fuma cigarros mais caros do que os de preço mínimo, 2/3 do consumo, não compra do mercado ilegal? Não faz sentido matemático. Tampouco faz sentido declarar que atingiu-se o pico de arrecadação, pois a receita continua estável, particularmente porque a última vez que se alterou alíquota do tributo foi no fim de 2016, portanto, quase três anos atrás.

Acredito que a estratégia foi uma ofensiva da indústria do cigarro para antecipar a onda de pressão para que se volte a aumentar os tributos. Uma estratégia militar conhecida como “ataque de prevenção”.

Como está a probabilidade de haver uma alíquota de tributos e cobrar mais pelas externalidades causadas pelo consumo produtos nocivos à saúde, como cigarros e bebidas?

Os desafios para o Estado exercer sua função soberana de implementar tributos seletivos sobre bebidas adoçadas são similares aos enfrentados pelo processo de tributação dos cigarros – exceto pelo fator contrabando. Evidências comprovam que bebidas adoçadas com açúcar, ou em combinação com outros adoçantes, são determinantes comerciais que vêm contribuindo para o aumento de doenças crônicas não transmissíveis, como a obesidade e suas consequências em médio e longo prazo: diabetes tipo 2, condições cardiovasculares e até o câncer de pâncreas.

O sabor doce está relacionado a satisfação prazerosa, afetando a produção de serotonina no indivíduo. Ou seja, o doce vicia. Tal vício é prejudicial. E uma bebida adoçada produzida industrialmente tem a maior taxa de doçura por volume encontrada em qualquer alimento ultraprocessado. Imagine: uma latinha de refrigerante contém catorze colheres de açúcar, muito além do que se coloca em um café.

A indústria de bebidas usa as mesmas táticas da do cigarro. Primeiro questionam as evidências com dados espúrios, depois lamentam que o aumento do preço, por causa do tributo, vai inviabilizar a indústria, criando desemprego, e que iria de encontro à liberdade de mercado e competição. Criam argumentos baseados em fantasia.

O mercado de bebidas adoçadas no Brasil e no mundo é um oligopólio, duas ou três empresas dominam e ditam as regras, maximizando o lucro através de ferramentas de microeconomia. Os empregos diretos são poucos pois o processo é automatizado.

E as empresas têm isenções fiscais, não é?

No Brasil, através da Zona Franca de Manaus e outras “políticas de desenvolvimento” regionais e locais, as empresas recebem bilhões em subsídios e incentivos fiscais que garantem a manutenção do lucro líquido na casa dos bilhões de reais. Portanto, aplicar políticas de tributos seletivos para reduzir problemas causados por indústrias devia ser a norma de um Estado soberano forte, mas aí reside a barreira. A tendência de governantes é, antes de tudo, querer beneficiar o mercado em detrimento de mudanças que elevem o bem-estar geral da população. Isto precisa mudar.

Você vem acompanhando a agenda 2030, que trabalha metas de desenvolvimento sustentável. O país está avançando em sua implantação?

O Brasil está avançando na implementação da Agenda 2030 do desenvolvimento sustentável a passos lentos. A sociedade civil organizada tem sido a protagonista dessa implementação, monitorando, capacitando e disseminando seus princípios, que, em diversos casos, ferem justamente os privilégios de determinantes industriais e comerciais do “mercado”. O Governo Federal, com algumas exceções localizadas em alguns ministérios, não está avançando a implementação.

Os governos estaduais e municipais ainda não compreenderam o alcance do roteiro fornecido pelos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, pois os orçamentos ainda são direcionados para “os negócios de sempre”. Além disso, no sentido ético-moral, o novo governo que ocupa o Palácio do Planalto constantemente busca editar decretos que ferem as metas da Agenda 2030, além de fazer discursos completamente desrespeitosos ao conteúdo dos ODS.

O potencial do Brasil se alavancaria se a implementação da Agenda 2030 fosse acelerada, com uma participação mais ativa dos governos em todos os níveis, mas, por enquanto, conta-se mais com o trabalho capilarizado de organizações não governamentais responsáveis. No entanto, para sermos sinceros, mesmo sendo louváveis e extremamente importante todas as ações localizadas, precisamos de ações de maior impacto, pois não se pode lidar com problemas criados industrialmente com soluções artesanais. As boas práticas precisam ser incentivadas e, principalmente, financiadas, para aumentarem seus alcances.

Quais os principais desafios em relação à agenda 2030?

O primeiro grande desafio à Agenda 2030 é a submissão do Estado à força dos mercados (o dogma do capitalismo liberal e neoliberal, que evita regulação). Como disse o banqueiro Steve Waygood, no Fórum Político de Alto Nível de 2018, “a Agenda 2030 é a prova de que as forças dos mercados falham. Precisamos de liderança e decisões acertadas”.

Alguns bilionários americanos, como Warren Buffet e Bill Gates, declaram: “Tesouro, tribute mais de nós”. Então precisamos alterar a forma de governar e exercer a responsabilidade soberana do Estado.

Outro desafio, este diante das condições atuais, é a falta de vontade política do Governo Federal ao nem sequer pensar na mudança de paradigma econômico, social e ambiental. Ao contrário, o Presidente e seus Ministros estão trabalhando para fortalecer o paradigma econômico baseado em privilégios empresariais, destruir o pacto social através da polarização ideológica e moral, e incentivando os crimes ambientais com o desmonte de políticas e órgãos de fiscalização. Assim, a brecha para implementar a Agenda 2030 no Brasil recai muito mais sobre os governos estaduais, e sobre a já comprometida sociedade civil organizada.

E o terceiro grande desafio é o financiamento para o desenvolvimento sustentável. Como disse o Embaixador de Zâmbia, no último Fórum de Financiamento para o Desenvolvimento, “precisamos tapar os buracos, parar de financiar a economia marrom, parar de subsidiar o que causa o problema em primeiro lugar”.

Voltando à questão das bebidas adoçadas e dos cigarros, corresponde a conter os determinantes comerciais que são a causa de problemas de saúde e investir em soluções, dentre as quais, forçando a redução da demanda por esses produtos. Como? Aumentando o preço através de tributos e direcionando a receita para “tapar o buraco” na saúde pública.



#CONTADOCIGARRO



Se você tivesse R$ 57 bilhões para investir no Brasil, o que você faria?  Essa é a pergunta que a ACT fez para várias pessoas nas ruas do Rio, em vídeo que faz parte da campanha #ContaDoCigarro, que alerta para os prejuízos do fumo aos cofres públicos.

Os R$ 57 bilhões são o valor anual das despesas relacionadas a doenças causadas pelo cigarro, uma conta que todos nós pagamos. A soma, verificada em pesquisa do Instituto Nacional do Câncer (Inca), entre outras organizações, mostra como essa conta não fecha: R$ 39,4 bilhões são com despesas médicas, e R$ 17,5 bilhões com custos indiretos, pela perda de produtividade, como incapacidade ou morte prematura. Enquanto isso, a arrecadação de impostos sobre a venda de cigarros está na ordem de R$ 13 bilhões. O déficit é de cerca de R$ 44 bilhões.

É bom também lembrar que são 156.216 mortes anuais, ou 428 mortes por dia. Para ter uma comparação, o maior acidente aéreo brasileiro, ocorrido há 12 anos, matou 199 pessoas.

Participe da campanha. Grave um depoimento, envie para a ACT. Compartilhe.



PROJETO ANTIFUMO APROVADO NO SENADO



O projeto de lei de prevenção do fumo (PLS 769/15), do senador José Serra, foi aprovado, por unanimidade, com 18 votos favoráveis, pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal, em 3 de julho. O PLS proíbe totalmente a propaganda de cigarros em pontos de venda, o uso de aditivos de sabor e estabelece como infração gravíssima o ato de fumar em veículos com menores de idade e gestantes. O texto aprovado aumenta o destaque das advertências sanitárias nos maços de cigarros. Na forma original, o PLS estava propondo o uso de embalagens padronizadas.

Em trâmite há quatro anos no Senado Federal, o projeto deve seguir para a Câmara dos Deputados.

Para a ACT Promoção da Saúde, é positiva a aprovação do PLS 769 e espera-se que seja aprovado na Câmara.

A organização esperava também a aprovação das embalagens padronizadas, que ainda podem ser propostas pela Câmara dos Deputados e, neste caso, o projeto volta ao Senado.  Sobre o tema, também tramita na Câmara, na Comissão de Desenvolvimento Econômico,  o projeto de lei 1744/15, mas o relator, deputado Efraim Filho, ainda não entregou seu relatório.



ESTUDO INCONSISTENTE



A LMV Consultoria Econômica fez uma análise crítica para a ACT Promoção da Saúde de um estudo de 2017 a respeito do mercado ilícito de produtos de tabaco. Economistas, os autores analisaram de forma crítica o texto que serviu de base para a criação de grupo de estudo pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública para analisar baixar os impostos de produtos de tabaco.

O texto analisado e que serviu de base para o GT, de acordo com consultoria, carece de rigor teórico e técnico, não apresentando conclusões robustas e que possam sobreviver a questionamentos mais elaborados. Entre os pontos controversos que encontraram, estão:

  • Poucas referências bibliográficas
  • Falta de consenso do arcabouça teórico que justificaria o GT (estudos de Curva de Laffer)
  • Dados utilizados questionáveis
  • Falta de robustez de questões econométricas
  • Falta de substância no encadeamento do estudo e das conclusões
  • Falta de análise das políticas públicas de saúde


DISPOSITIVOS PARA FUMAR



A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) realizará duas audiências públicas sobre uso de novos dispositivos eletrônicos para fumar, como cigarro eletrônico e tabaco aquecido. A primeira será em Brasília, em 8 de agosto, e a segunda no Rio de Janeiro, ainda sem data marcada.  A  sugestão que um dos debates aconteça no Rio foi apresentada por diversas organizações de controle do tabagismo, como a ACT Promoção da Saúde, em reunião ocorrida em 18 de junho, em Brasília.

Para essas organizações, os novos produtos de tabaco, cuja comercialização, importação e propaganda são proibidas no país, podem atrair consumidores mais jovens ao tabagismo. Elas também alegam que  não há estudos científicos suficientes para afirmar que são seguros e diminuem os riscos de doenças, quando comparados aos cigarros tradicionais.

“Trata-se de uma agenda apenas de interesse da indústria, pois do ponto de vista da saúde pública não há pressão para a liberação desses produtos no mercado brasileiro, devido à falta de consenso de que sejam de risco reduzido. Defendemos que devem haver mais pesquisas independentes, sem conflito de interesses, sobre o uso de dispositivos eletrônicos para fumar e seus riscos à saúde, uma vez que ainda há extenso debate quanto ao real impacto destes produtos”, disse Ticiana Imbroisi, assessora de advocacy da ACT.

Já a Philip Morris, que vem investindo esforços de forma agressiva para liberar os novos produtos,  enviou um representante, que disse que, ao não regular o assunto, a Anvisa perde oportunidade de fiscalizar os novos produtos e educar consumidores.

A indústria tem feito propaganda de dispositivos eletrônicos para fumar e tentado espaços pagos em jornais. Há sites no Brasil para a venda de cigarros eletrônicos e propaganda em mídias sociais, como Instagram, com o uso de influenciadores digitais. “Ao promover produtos proibidos para a venda no Brasil, a indústria está promovendo uma forma de mercado ilegal – do qual tanto se queixa em outras ocasiões”, completou Ticiana.



FARRA DOS REFRIGERANTES



A presidência da República alterou a alíquota de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre o xarope de refrigerantes e outras bebidas para empresas instaladas na Zona Franca de Manaus (ZFM), o que na prática reduz a arrecadação fiscal e prejudica a saúde da população, onerando o sistema de saúde.

Por meio do decreto no. 9.897, de 1o de julho, a alíquota que seria de 8% entre 1º de julho e 31 de dezembro/2019 (Decreto 9.514/2018[1]) passa a ser de 10% a partir de outubro até dezembro/2019. Apesar de a alíquota do IPI ser zero para a compra de produtos fabricados na ZFM, as empresas adquirentes desses produtos, em sua maioria localizadas fora da ZFM, têm direito ao crédito tributário respectivo como se houvessem pago aquele imposto. Isso favorece toda a sua cadeia de produção e contribui para a redução do preço final e aumento no consumo de um produto que causa malefícios à saúde. 

A ACT e a Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável fizeram nota de repúdio ao que consideram uma farra dos refrigerantes, que pode ser lida aqui.




CONSEA: IDAS E VINDAS



No primeiro dia do atual governo, foi assinada a Medida Provisória nº 870/2019, que organizou a estrutura dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios e, entre as mudanças, extinguiu o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), que funcionava como um órgão consultivo ligado à Presidência da República. A extinção foi considerada inconstitucional pelo Ministério Público Federal (MPF) e foi criada uma Comissão Especial Mista no Congresso Nacional para analisar a MP, além de haver grande mobilização da sociedade civil. O Consea foi recriado em votações na Câmara e no Senado.  No entanto, ao sancionar o texto por meio da Lei nº 13.844, de 18 de junho de 2019, o presidente Jair Bolsonaro vetou o inciso que tratava da vinculação do Consea ao Ministério da Cidadania.

Conversamos com Elisabetta Recine, coordenadora do Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição da Universidade de Brasília, que ocupou a presidência do Consea entre 2017 e 2018, e vem acompanhando as idas e vindas.

Há algum motivo principal que preocupa o veto à recriação do conselho?

A análise que estamos fazendo é que o veto do presidente não atingiu a recriação do Consea. Atingiu apenas o local, a localização do Conselho. A emenda que foi aprovada no relatório e depois nos dois plenários, que foi pra sanção do presidente e que ele não vetou, recompôs o texto original da Losan, a lei orgânica de segurança alimentar e nutricional. Só não ficou válida a localização do Conselho, porque isso está em outra estrutura. Então existia um outro elemento da emenda que foi aprovada, que era indicar que o Consea ficaria localizado no Ministério da Cidadania, porque a responsabilidade dessa agenda é do Ministério da Cidadania. Isso sim foi vetado.

E qual o impacto disso?

Todo o trabalho que o conselho precisa fazer e desenvolver, em relação ao monitoramento das políticas, entre outros, continua paralisado. Existem riscos importantes com a ausência do monitoramento da política, que é a desestruturação dessas ações. Consequentemente, grupos da população mais vulneráveis não estão sendo atendidos. As políticas públicas não estão sendo monitoradas pela sociedade civil. Nós não sabemos a extensão hoje da implementação das ações - se é elas estão sendo desenvolvidas.

Continua a mobilização  da sociedade civil?

Tem sim, continua a mobilização que vem desde a edição original, da Medida Provisória, em 1o de janeiro. Os Conseas estaduais continuam o seu trabalho de organização das conferências estaduais. Há um processo de articulação dentro da sociedade, de maneira mais ampla, para que os deputados possam fazer primeiro esse veto cair. Assim o Consea volta a ter um locus e o Ministério da Cidadania pode assumir e implementar a sua responsabilidade plena em relação à política nacional de segurança alimentar e nutricional. O grande problema, do ponto de vista geral, de a gente não ter hoje um sistema de segurança alimentar e nutricional sendo implementado na sua totalidade e na sua potencialidade, é que a gente tem um enfraquecimento geral das políticas públicas que garantem e promovem a alimentação adequada e saudável para toda a população - e não só para os grupos em maior situação de vulnerabilidade.

Enfim, um enfraquecimento geral das politicas que garantem que todas as etapas do sistema alimentar que vão da produção, comercialização, abastecimento, processamento dos alimentos, promoção de um consumo saudável, estão frágeis. E isso atinge a população como um todo.



ALIANÇA CHEGA AO RIO



Depois de Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife e Campo Grande, chegou a vez do Rio de Janeiro receber um encontro regional da Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável, no dia 9.

Apesar de já existir desde 2018, o núcleo carioca da Aliança ainda não havia tido um encontro oficial de lançamento para promover a integração dos seus atuais e novos membros. A ideia da formação destes núcleos locais é debater sobre as particularidades de cada região, além de planejar as prioridades de ação da Aliança para o 2º semestre de 2019. Entre os convidados, pessoas que já são membros da coalizão e também outros representantes de organizações, movimentos sociais, associações e instituições que tenham relação com os temas da agenda de ação da Aliança.

“Os encontros para formação dos núcleos locais promovem sempre a aproximação e articulação e buscam potencializar e otimizar seus esforços. Embora tenha sido comum a todos a priorização da defesa da alimentação adequada e saudável no ambiente escolar e da produção agroecológica de alimentos, identificamos que os estados apresentam estágios bem diferentes de políticas públicas e de mobilização da sociedade nessas áreas. Assim, a importância de desenvolvimento dos núcleos locais da Aliança ficou ainda mais evidente”,  explica Kelly Alves, consultora da ACT e coordenadora das Alianças locais. 

No Distrito Federal, também estão ocorrendo iniciativas para formação de um núcleo local. E entre os dias 1 e 3 de agosto, haverá o encontro de formação no núcleo da Aliança Santa Catarina, em Florianópolis.



NOTÍCIAS





Comissão do Senado aprova proibição de propaganda de cigarros até nos pontos de venda
Folha de S. Paulo, 4/7/19
A CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado aprovou nesta quarta-feira (3) um projeto de lei que proíbe qualquer forma de propaganda de tabaco, cigarros, cigarrilhas, charutos e cachimbos até mesmo nos locais de venda. O texto ainda segue para a Câmara. Pela proposta, também fica proibida a importação e a comercialização de cigarro com sabor.
http://actbr.org.br/post/comissao-do-senado-aprova-proibicao-de-propaganda-de-cigarros-ate-nos-pontos-de-venda/18006/

Ministro da Saúde diz que não foi consultado sobre isenção a refrigerantes
O Estado de S.Paulo, 2/7/19
O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, afirmou não ter sido consultado sobre o aumento de benefícios para a indústria de refrigerantes instalada na Zona Franca de Manaus. Ele, porém, foi enfático ao tentar afastar a relação entre a medida e o risco para o aumento da obesidade no País. Para Mandetta, as medidas mais importantes para reverter a tendência são educação e promoção da atividade física. 
http://actbr.org.br/post/ministro-da-saude-diz-que-nao-foi-consultado-sobre-isencao-a-refrigerantes/18003/

Cai número de fumantes no País
Gazeta de São Paulo, 29/6/19
Uma pesquisa do Ministério da Saúde mostrou uma redução na quantidade de pessoas que fumam no Brasil. Em 2006, quando o estudo começou a ser feito, 15,6% da população fumava. Em 2017 (últimos dados disponíveis), esse percentual passou a ser de 10,1%: uma diminuição de quase 40%.
http://actbr.org.br/post/cai-numero-de-fumantes-no-pais/18001/

Cigarro da moda nos EUA, Juul é vendido ilegalmente via delivery no Brasil
Folha de S. Paulo, 23/6/19
Após virar moda entre adolescentes e dor de cabeça para a agência reguladora dos EUA, o cigarro eletrônico Juul chega ao Brasil com estratégias que parecem copiar as que fazem sucesso lá fora: publicações em redes sociais, divulgação via influenciadores digitais e estandes em festivais e baladas.
http://actbr.org.br/post/cigarro-da-moda-nos-eua-juul-e-vendido-ilegalmente-via-delivery-no-brasil/17990/



ACT LEGAL



As embalagens padronizadas de cigarros

Adriana Carvalho
Diretora jurídica da ACT

“A liberdade de iniciativa não impede a imposição, pelo Estado, de condições e limites para a exploração de atividades privadas tendo em vista sua compatibilização com os demais princípios, garantias, direitos fundamentais e proteções constitucionais, individuais ou sociais, destacando-se, no caso do controle do tabaco, a proteção da saúde e o direito à informação.

O risco associado ao consumo do tabaco justifica a sujeição do seu mercado a intensa regulação sanitária, tendo em vista o interesse público na proteção e na promoção da saúde.” (Ministra Rosa Weber – Acórdão ADI 4874 – fev/2018)

Essa posição do Supremo Tribunal Federal reforça o entendimento de que a livre iniciativa não é um direito absoluto, que deve ser compatível com outros direitos, princípios e garantias da Constituição Federal, com destaque para o controle do tabaco, a proteção à saúde e o direito à informação. E que os riscos do tabagismo justificam a intensa regulação do mercado, em defesa do interesse público.

Assim, as medidas da Convenção Quadro para o Controle do Tabaco (Dec. 5.658/2006) devem ser implementadas, a despeito dos argumentos do setor econômico.

No caso da adoção das embalagens padronizadas para cigarros, a indústria do tabaco alega que a medida viola o direito de propriedade da marca, o que não é verdade.

Com esta medida, as embalagens passam a ser iguais, seguindo um padrão, determinado pelo poder público, mantendo-se o nome da marca. A embalagem passa a ser livre de logotipos, marcas, design e elementos promocionais.

Contudo, não há expropriação direta ou indireta da marca, que segue como propriedade das fabricantes. O que há é controle e limitação ao uso da marca para fins de publicidade danosa à saúde e a vidas humanas, por questões de saúde pública. É a regulação do direito de propriedade. O Estado não toma nem adquire a propriedade.

A medida já foi aprovada em 16 países: Bélgica, Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Reino Unido, França, Irlanda, Noruega, Hungria, Eslovênia, Turquia, Uruguai, Tailândia, Arábia Saudita, Singapura e Israel.

A Corte Constitucional da Austrália, a Alta Corte de Justiça do Reino Unido e o Conselho Constitucional da França, países membros do Acordo sobre Aspectos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio - TRIPS, como o Brasil: reconhecem a constitucionalidade da medida e que não há expropriação ou violação do direito de propriedade.







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