Aditivos em cigarros: o STF decidiu pela saúde!
17.02.19JOTA - Adriana Carvalho e Walter Moura
É difícil acreditar que ações individuais ainda sejam apresentadas contestando entendimento de um julgado recente do Supremo
Crédito: Pixabay
Há um ano, o plenário do STF julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4874, proposta pela Confederação Nacional da Indústria que visava invalidar uma Resolução da ANVISA (RDC 14/2012), que regulamenta o uso de aditivos em produtos de tabaco.
O Supremo manteve a constitucionalidade da norma da ANVISA e reafirmou a autoridade da agência para a regulação de produtos nocivos à saúde.
Essa decisão retrata a opção da Corte Suprema do país pelo paradigma da saúde, além de representar uma grande vitória aos brasileiros de hoje e as futuras gerações.
O STF reconheceu expressamente que o risco associado ao consumo do tabaco justifica a regulação prudencial desse mercado, em razão do interesse público na proteção e promoção da saúde.
O julgado ainda realçou que o valor jurídico da livre iniciativa deve conviver com limites disciplinados pelo Estado para a exploração de atividades privadas, de forma a compatibilizá-las com princípios, garantias, direitos fundamentais e proteções constitucionais: que, nesse caso, é a proteção do direito à saúde (via controle do controle do tabaco) e o direito à informação.
A ACT Promoção da Saúde teve a honra de participar do julgamento desse processo como Amicus Curiae, e contribuir para a defesa da RDC 14/2012 e da autoridade da ANVISA. A entidade apresentou estudos, memoriais e sustentação oral realçando que a limitação do poder da ANVISA seria grave ameaça à saúde, retirando a precaução para que crianças e jovens deixem de ser facilmente atraídos para o consumo de cigarros com sabores de balas e chicletes.
A validade da norma regulamentar, contudo, ainda é objeto de discussões na Justiça Federal e, a despeito da decisão do STF, a RDC 14/2012 ainda está suspensa por algumas liminares isoladas.
Como houve empate na decisão do STF sobre a constitucionalidade da norma (com 5 ministros votando para cada entendimento), a Corte não reconheceu o seu efeito vinculante da decisão em relação a todas as instâncias ordinárias.
A decisão do Supremo não encerrou todas as ações judiciais então existentes, à época do julgamento, e ainda permitiu o surgimento de inúmeras outras, onde a Indústria persiste em combater a RDC 14/2012. Até o momento, há 13 ações, e o Tribunal Regional Federal da 1ª Região ainda não se pronunciou sobre o tema. A leitura dessas ações retrata um verdadeiro repertório de feitos idênticos, nitidamente em atuação concertada dos demandantes (produtores, industriais ou entes associativos vinculados ao tabaco).
Contudo, as decisões que vierem a ser proferidas em primeira e segunda instância, naquelas ações (antigas e novas), não podem estar destoadas do quanto já foi decidido pelo STF, no julgamento da ADI 4874.
Recentemente, a Ministra Cármen Lúcia decidiu liminarmente a Reclamação (Rcl 32.787), apresentada pela ANVISA, e ponderou que “embora não se tenha obtido quórum de maioria absoluta para a declaração de compatibilidade constitucional da Resolução RDC n. 14/2012 em razão do impedimento de um dos Ministros presentes na sessão de julgamento, a questão específica da constitucionalidade desta resolução foi detidamente examinada e julgada”.
Empates a parte, o Supremo já definiu o tema da constitucionalidade da norma da ANVISA. Revisitá-la em instâncias ordinárias, sob a mesma argumentação, é apostar na tese absurda de que o órgão máximo do Judiciário não tenha o poder de uniformizar entendimentos.
Diante desse contexto, em busca de Segurança Jurídica, maior celeridade e Economia Processual, em abril de 2018, a ANVISA apresentou perante o TRF-1 (na Apelação nº 0046408-58.2012.4.01.3300/
O IAC ainda não foi julgado, e é certamente o melhor caminho para se evitar dispersão jurisprudencial.
O professor Cássio Scarpinella Bueno tem estudo sobre IAC elucidando que “o objetivo do mencionado instituto processual é a fixação de uma tese paradigmática a ser aplicada em casos análogos a partir da grande relevância social e do interesse público decorrente de determinado caso, evitando assim dispersões jurisprudenciais que acarretariam diversos conflitos oriundos de decisões antagônicas, comprometendo a isonomia, a previsibilidade e, em última análise, a segurança jurídica”.
Na conclusão de seu estudo para o caso concreto do tabaco, o professor Cássio conclui não haver óbice para que o Eg. TRF1 instaure, processe e julgue o IAC apresentado pela ANVISA, em função da existência de 13 ações judiciais que tramitam sob sua jurisdição, “em função da inegável repercussão social que a questão jurídica em todos eles debatida (invalidade da Resolução n. 14/2012 editada pela ANVISA), sendo indiferente também que ao menos um daqueles processos já tenha recebido sentença na primeira instância”.
Se o Judiciário busca uniformidade de seus entendimentos, sobretudo após o Código de 2015, é difícil acreditar que ações individuais ainda sejam apresentadas contestando o entendimento de um julgado recente do Supremo Tribunal Federal. O conjunto de ações transparece um comportamento contraproducente à Segurança Jurídica, infelizmente ainda comum à realidade brasileira. Agora, com o advento do IAC, espera-se que o Judiciário possa se proteger e realmente uniformizar seus entendimentos, neste caso, em favor da Saúde.
ADRIANA CARVALHO – Advogada e diretora jurídica da ACT Promoção da Saúde.
WALTER JOSÉ FAIAD DE MOURA – Advogado sócio do escritório WMAA Advogados — Walter Moura Advogados Associados.