Cigarro eletrônico na adolescência
27.04.20Drauzio Varella
A indústria acrescenta sabores ao cigarro para disfarçar o gosto de fumo queimado.
Mentol e as essências de baunilha, morango, maçã, chocolate, crème brûlée têm sido empregadas com o objetivo de tornar o cigarro mais palatável às crianças e aos adolescentes. Tentativas da Anvisa de proibir essa prática criminosa, têm fracassado diante do lobby milionário da indústria tabaqueira.
O Food and Drug Administration (FDA), dos Estados Unidos, acaba de banir a adição dessas essências nos cigarros eletrônicos. Sim, eles usaram a mesma estratégia para arregimentar legiões de adolescentes dependentes da nicotina, inalada em dispositivos no formato de pen drives com baterias adaptadas para receber carga nos computadores da criançada.
A quantidade de nicotina presente nos reservatórios desses dispositivos é muito alta. Alguns deles chegam a conter o equivalente à de um maço inteiro.
O impacto dos cigarros eletrônicos foi tão grande naquele país que, finalmente, atraiu o interesse dos neurocientistas para estudar a ação a longo prazo da droga, no cérebro em desenvolvimento.
Neste mês, fevereiro de 2020, no congresso anual da Academia Americana de Ciências, a neurocientista Marina Picciotto, da Universidade Yale, apresentou os resultados de estudos conduzidos em animais, uma vez que a moda dos cigarros eletrônicos em humanos é recente.
A vitamina E não é o único produto encontrado em alguns dispositivos, existem outros. Um deles, o polietileno glicol, é parente do dietileno glicol que provocou a tragédia da cerveja em Minas Gerais.
A nicotina tem a propriedade de ressaltar o prazer proporcionado pelos sabores adicionados ao vaporizador, dando origem a associações neurais que a tornam mais desejável. Pelo mesmo mecanismo, ela acentua a sensação de prazer provocada por outros estímulos agradáveis, como ouvir música, tomar café ou ter uma experiência sexual.
Camundongos adolescentes expostos aos vapores de nicotina desenvolvem alterações estruturais em seus neurônios, que modificam o tráfego de informações pelo tecido cerebral. Os camundongos se tornam mais sensíveis ao estresse e passam a responder a estímulos fracos que não chegam a provocar reação nos que não foram expostos à droga.
Assim, choques elétricos de baixíssima intensidade que não chegam a ser percebidos por camundongos não expostos, provocam reações exageradas nos que foram expostos.
Comportamentos semelhantes foram descritos em crianças cujas mães fumaram durante a gravidez.
Além da nicotina, o líquido usado nos vaporizadores contém outras substâncias nocivas, algumas das quais são responsáveis pelas 64 mortes e as quase 3 mil internações hospitalares ocorridas nos Estados Unidos. Segundo o Center for Diseases Control (CDC) daquele país, a causa mais provável é a presença do óleo de vitamina E na solução contendo nicotina inalada.
A vitamina E não é o único produto encontrado em alguns dispositivos, existem outros. Um deles, o polietileno glicol, é parente do dietileno glicol que provocou a tragédia da cerveja em Minas Gerais.
Viciar crianças em nicotina é o negócio dessa indústria. Não é à toa que a Organização Mundial da Saúde considera o fumo uma doença pediátrica.