Litígios no Brasil: Publicidade de Produtos de Tabaco

Supremo Tribunal Federal

A Confederação Nacional da Indústria – CNI ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3311) em 2004, no Supremo Tribunal Federal, questionando a constitucionalidade da lei 9.294/96 no tocante à restrição da propaganda comercial de produtos de tabaco e à obrigação do uso de advertências sanitárias nas embalagens desses produtos.

A ACT foi admitida como amicus curiae nesta ADI, juntamente com o Brasilcon – Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor e o IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor. Até o momento, não houve julgamento.

 

Mensagem subliminar - veiculação da propaganda "Artista Plástico II"

O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios conseguiu em primeira instância a condenação da Souza Cruz e das agências de publicidade ao pagamento de R$ 14.000.000,00 em danos morais por fazer publicidade considerada enganosa e abusiva, voltada para os jovens e com imagens subliminares. O Tribunal Regional Federal reduziu a condenação a R$ 4 milhoes.

Houve recurso ao Superior Tribunal de Justiça - STJ, e o(a)s Ministro(a) da Quarta Turma reduziram significativamente o valor da condenação, pois arbitraram a reparação pelo dano moral coletivo em R$ 1 milhão. O STJ, ainda, confirmou a decisão do TJ/DF, para excluir o dever de contrapropaganda.

O valor da indenização é notoriamente irrisório, insuficiente para a efetiva prevenção e reparação de danos morais coletivos e difusos dos consumidores, e, portanto, para atender as finalidades da reparação. O valor gasto na produção e veiculação da propaganda "Artista Plástico II" foi da ordem de US$ 7 milhões de dólares, como apontado na sentença.

Entendemos que a efetividade da condenação pode ser questionada diante da finalidade preventiva e educativa que se espera de uma reparação de danos morais. A decisão do STJ foi proferida mais de 10 anos depois do ajuizamento da ação, que, por sua vez, ocorreu cerca de quatro anos após a veiculação do comercial, e a condenação foi sensivelmente reduzida, determinando o pagamento de uma quantia insignificante diante do poder econômico das empresas rés. Assim, transmite-se à sociedade uma imagem de impunidade, posto que tardia a justiça, com pouca capacidade para desestimular e intimidar futuras práticas comerciais.

 

Proibição de venda de cigarros com quaisquer outros produtos ("brindes")

Decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo proíbe fabricantes de cigarros de venderem seus produtos associados a outros, sob pena de multa de R$ 750 mil por infração, e é válida para todo o território nacional (processo nº 0226270-59.2009.8.26.0100).

Em junho de 2018, por unanimidade, os desembargadores julgaram apelação da ACT Promoção da Saúde, e anularam a decisão que homologou acordo que o Ministério Público do estado havia realizado com a Souza Cruz e a Phillip Morris. Em seguida, anulou o acordo e julgou o mérito da ação para proibir que as empresas vendam cigarros com outros produtos.

O acordo, realizado em ação civil pública ajuizada pelo próprio Ministério Público, permitia a venda cigarros com produtos relacionados ao ato de fumar, como isqueiros e cinzeiros, em total violação à lei.

O tribunal considerou que o acordo, nos termos em que homologado, não se presta a efetivamente proteger o consumidor das práticas comerciais adotadas pelas rés de incentivo àaquisição de produtos fumígenos.

As empresas estão proibidas de: (i) promover a venda ou a distribuição de produtos, de forma gratuita ou onerosa, em embalagens ou invólucros que contenham os logotipos ou maços das marcas dos cigarros que produzem e de (ii) promover a venda ou distribuição de quaisquer produtos acompanhados de maços dos cigarros, por meio de oferta ao consumidor para aquisição conjunta e simultânea, fixando multa cominatória de R$ 750.000,00 por campanha publicitária individualmente considerada para o caso de violação de quaisquer das obrigações de não fazer impostas, a ser recolhida ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos previsto no art. 13 da lei de Ação Civil Pública - LACP (nº 7.347/85), condenando ainda as requeridas ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios em favor da litisconsorte vencedora ACT, fixados por equidade em R$ 3.000,00.

A lei 9.294/96, que regulamenta os produtos de tabaco no país, até o ano de 2011, restringia a propaganda comercial destes a pôsteres, paineis e cartazes na parte interna dos locais de venda.  Com a alteração em 2011, a regra geral passou a ser a proibição da propaganda comercial de produtos de tabaco, permitindo, em caráter de exceção, apenas a exibição dos produtos nos locais de venda.

A lei, portanto, não permite a venda de cigarros com quaisquer outros produtos.

A ação decorre de denúncia da ACT ao MPSP, por haver no mercado embalagens de cigarros sendo vendidas em um mesmo invólucro com base de IPOD, mochilas, cinzeiros, isqueiros, inclusive isqueiros eletrônicos USB, cigarreiras, coqueteleiras, etc.

A ACT, apesar de atuar como litisconsorte ativo neste processo, não foi intimada a participar do acordo realizado entre o MP e as empresas rés, tão pouco foi intimada para manifestação sobre seus termos previamente à homologação.  

A decisão judicial e o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, favorável à apelação da ACT, estão absolutamente alinhados com o controle do tabagismo, defesa do consumidor e promoção da saúde pública.

Os magistrados consideraram que fumantes e não fumantes devem ser igualmente protegidos das práticas comerciais da indústria do tabaco, e que a venda de cigarros com outros produtos configura propaganda comercial vedada pela lei.

Após recurso da Souza Cruz, o Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo Dr. Hugo Crepaldi atribuiu o prazo de dois meses para que as empresas fabricantes de cigarro se adequarem à proibição, datados partir da publicação do acórdão. Como parte de uma recorrente estratégia da indústria de postergar a implementação das políticas de controle do tabaco, ambas as empresas recorreram dessa decisão, em dezembro/2019, ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal, mas desistiram em maio de 2023. Elas não são obrigadas a justificar o pedido de desistência, mas a nossa avaliação é que identificaram risco de perda da ação e decidiram evitar uma decisão desfavorável nas cortes superiores. Os dois tribunais já homologaram a desistência.

 

Multa PROCON – veiculação da propaganda “Talvez Marlboro”

A Philip Morris Brasil Indústria e Comércio Ltda. ajuizou ação anulatória contra multa aplicada pelo PROCON, no valor de R$ 616.633,62, após veiculação de propaganda comercial de cigarros da marca Marlboro no interior dos locais de venda. A imagem do anúncio publicitário contava com um adulto empurrando um sofá com a frase “Talvez vou ser independente”, em que sobre o “talvez” se sobrepunha um X, ficando legível aos consumidores apenas os dizeres “vou ser independente”. Alegou o PROCON que essa propaganda seria abusiva e feriria o Código de Defesa do Consumidor, por fazer a alusão entre o ato de fumar e a ideia de independência, apelativa ao público jovem.

Após o depósito do valor integral da multa em juízo pela Philip Morris, o seu pedido de anulação foi negado em 1ª instância. Entendeu o juiz que a vinculação de uma propaganda que busque estimar o consumo de um bem tóxico, atrelando-o à ideia de autonomia, viola o Código de Defesa do Consumidor (art. 37, § 2º). O Tribunal de Apelação foi no mesmo entendimento, e defendeu o caráter abusivo da publicidade por ser “suscetível de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúda ou segurança.”

Apesar do valor da multa ser relativamente baixo se comparado ao lucro anual da Philip Morris International (em 2018, foi de R$ 1,91 bilhão), essa ação representa uma vitória das entidades envolvidas no controle do tabagismo no combate às táticas de marketing da indústria direcionadas ao público jovem. Essa campanha em particular foi divulgada em mais de 50 países, incluindo o Brasil, com a promoção de "um estilo de vida jovem, de tomada de riscos, de exploração e de liberdade", com o slogan “Não seja um Talvez. Seja Marlboro”. Em resposta, entre novembro/2012 e janeiro/2013, a ACT lançou a campanha Não existe talvez. Cigarro mata.

Saiba mais:

 

Publicidade ilegal no Rock in Rio em 2017 e 2019

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em 02/11/2020, proferiu decisão na ação civil pública proposta pelo Ministério Púbico em face do ROCK WORLD S.A., VEGA FINA TABACARIA e SOUZA CRUZ LTDA., em razão de publicidade ilegal nos eventos Rock in Rio 2017 e 2019.

Nessa decisão foi reconhecida a publicidade ilegal por meio de vendedores ambulantes e pelo uso de luminosos e embalagens não registradas na ANVISA nos pontos de venda. Não foi reconhecida como prática ilegal de venda casada a venda do kit composto por maço de cigarro e um isqueiro com logo do "Rock in Rio".

As rés foram condenadas:

  • ao pagamento de danos morais coletivos no valor de R$ 2 milhões, revertidos ao Fundo de Reconstituição de Bens Lesados;
  • a realizar contrapropaganda em parceria com determinadas universidades e hospitais, consistente na produção de material publicitário impresso e específico, em número não inferior a 14.000 exemplares, em formato de cartilha, a ser distribuído nos atendimentos ambulatoriais e de emergência dos hospitais públicos e particulares da cidade do Rio de Janeiro e Grande Rio, informando aos consumidores sobre os riscos, a prevenção e o tratamento das Doenças Pulmonares Obstrutivas Crônicas (DPOC) e a cessação do tabagismo; e
  • ao pagamento dos danos materiais e morais de que tenha padecido o consumidor, individualmente considerado, a serem apurados em liquidação de sentença.

No julgamento, foi reconhecido que a liberdade de iniciativa conferida pela Constituição (arts. 1º, IV, e 170, caput) não impede a imposição, pelo Estado, de condições e limites para a exploração de atividades privadas, tendo em vista sua compatibilização com os demais princípios, garantias, direitos fundamentais e proteções constitucionais, individuais ou sociais, destacando-se, no caso do controle do tabaco, a proteção da saúde e o direito à informação. Assim, o risco associado ao consumo do tabaco justifica a sujeição do seu mercado a intensa regulação sanitária.

 





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