Cigarro: Mais imposto é mais saúde

27.10.20


Correio Braziliense

No Brasil, o tabagismo responde por 12% de todos os óbitos e gera um custo de R$ 57 bilhões ao ano com tratamento e aposentadoria decorrentes de doenças causadas pelo tabaco. A arrecadação de tributos sobre produtos de tabaco não passa de R$ 13 bilhões ao ano, o que demonstra o quanto esse negócio prejudica a economia e a saúde do Brasil. E as estatísticas mostram que 90% dos fumantes começam a fumar antes dos 18 anos e, por isso, o tabagismo é considerado doença pediátrica.
 

A reforma tributária é uma oportunidade ímpar para reduzir o fardo de impostos que tanto pesa sobre as camadas mais pobres da população e, assim, contribuir para diminuir as desigualdades sociais. Se isso é verdade para a maioria dos serviços e bens de consumo, seguramente não se aplica ao mercado de cigarros e produtos similares.

Mas há quem ainda argumente "fuma quem quer" ou "a alta carga tributária sobre cigarros no Brasil aumenta o contrabando de cigarros". São vozes que defendem a redução dos impostos sobre o cigarro alegando que esse seria o caminho para enfrentar o contrabando de cigarros advindos principalmente do Paraguai. Isso não faz o menor sentido, a não ser para ampliar os estratosféricos lucros das empresas multinacionais de cigarros.

 

O Banco Mundial aponta que uma das medidas mais eficientes para reduzir o tabagismo e suas consequências é o aumento de impostos sobre cigarros e similares, de forma a aumentar seus preços, pois quanto mais caro for o produto, menos acessível se torna ao público infantojuvenil, especialmente das camadas mais pobres da população, nas quais hoje se concentra a maior proporção de fumantes. Por isso, essa é uma das medidas centrais da Convenção Quadro da OMS para Controle do Tabaco, tratado internacional de saúde ratificado pelo Congresso Nacional em 2005.

Boa parte desses fumantes não consegue deixar de fumar e busca cigarros mais baratos no mercado ilegal. Estudos do Banco Mundial mostram que o contrabando de cigarros está ligado à corrupção e ao crime organizado e são pouco influenciados pelas diferenças de tributação entre países. A impunidade, a corrupção e, certamente, o volume de fumantes nas camadas da população menos favorecidas, na verdade, tornam o contrabando de cigarros atraente e lucrativo.

 

No Brasil, a Receita Federal tem se esforçado para alinhar sua política tributária de forma a atender aos objetivos da política de controle do tabagismo. E, de fato, os ajustes que aplicou ao IPI e à política de preços mínimos a partir de 2011 levaram à significativa queda na prevalência de fumantes, especialmente nas populações de menor renda e escolaridade. No entanto, o último ajuste dos preços mínimos dos cigarros aconteceu em 2016. Um estudo divulgado pela Forbes em 2018 mostrou que o cigarro brasileiro é um dos mais baratos do mundo: 72ª posição entre 91 países analisados.

Enquanto na Austrália o maço de cigarro custa em torno de US$ 20, no Brasil custa, em média, US$ 2,22. Esse cenário mostra que a resposta ao mercado ilegal de cigarros não está na redução da carga tributária, mas, sim, na implementação plena das medidas previstas no Protocolo para Combater o Mercado Ilegal de Produtos de Tabaco ratificado em 2017 pelo Congresso Nacional.

Nesse sentido, defendemos que a reforma tributária aplique aos cigarros e a outros produtos de tabaco uma carga tributária maior, ou seja, o chamado imposto do pecado, como acontece em países desenvolvidos. Essa medida, certamente, acelerará a redução do tabagismo, principalmente nas camadas mais pobres e reduzirá a carga de doenças e o enorme prejuízo que o tabagismo causa.

Defendemos, ainda, que se aplique o princípio do poluidor pagador ao imposto seletivo sobre cigarros e similares, destinando uma fração da arrecadação para a implementação plena das demais medidas de prevenção, previstas na Convenção Quadro para Controle do Tabaco incluindo seu Protocolo para Eliminar o Mercado Ilegal de Cigarros. Certamente o Brasil vai ganhar em saúde, economia e segurança.

 

 * José Gomes Temporão é ex-ministro da Saúde

* Luiz Antônio Santini da Silva é ex-diretor do Instituto Nacional do Câncer

https://www.correiobraziliense.com.br/opiniao/2020/10/4884656-cigarromais-imposto-e-mais-saude.html




VOLTAR



Campanhas



Faça parte

REDE PROMOÇÃO DA SAÚDE

Um dos objetivos da ACT é consolidar uma rede formada por representantes da sociedade civil interessados em políticas públicas de promoção da saúde a fim de multiplicar a causa.


CADASTRE-SE