Dimensão Comercial dos Determinantes Sociais da Saúde e Doenças Crônicas Não Transmissíveis

12.11.20


Laura Cury e Mônica Andreis

A Organização Panamericana da Saúde (OPAS) acaba de lançar um novo documento, intitulado “Marco de Referência sobre a Dimensão Comercial dos Determinantes Sociais da Saúde na agenda de enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis”. Trata-se de uma publicação construída a partir da colaboração de vários especialistas, sobre um tema ainda novo, mas fundamental: os chamados determinantes comerciais da saúde (DCS). 

O termo refere-se a “estratégias e abordagens utilizadas pelo setor privado para promover produtos e escolhas que são prejudiciais à saúde” e constitui uma linha de pensamento que ultrapassa a análise de fatores individuais, incluindo, principalmente, contextos sociais. Ou seja, é destacado o papel da influência corporativa de indústrias de produtos não saudáveis na saúde da população brasileira e mundial. Ao promoverem o consumo em massa deste tipo de produto, essas indústrias causam impacto significativo nos indicadores de saúde da população, e elevam principalmente o risco de desenvolvimento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs).

As DCNTs, que incluem doenças cardiovasculares, diabetes, doenças respiratórias crônicas e câncer, são responsáveis por 71% de todas as mortes prematuras no mundo. O consumo de produtos de tabaco, de alimentos ultraprocessados e o consumo nocivo de álcool são os principais fatores de risco para o desenvolvimento dessas doenças . As DCNTs e seus fatores de risco também agravam o quadro de pacientes acometidos pela Covid-19. Não à toa, as indústrias que comercializam estes produtos são chamadas de Big Alcohol, Big Tobacco e Big Food , pelo enorme poder e influência sobre políticas, pesquisas e práticas que atingem a saúde pública, chegando a ser, inclusive, denominadas “vetores de doenças”.  

De acordo com o relatório  da OPAS, “a dimensão comercial pode comprometer a saúde e o meio ambiente quando as práticas coorporativas ou interesses comerciais buscam depreciar políticas públicas eficazes para maximizar lucros e vantagens comerciais. A dinâmica dessa dimensão comercial pode aprofundar as iniquidades sociais (iniquidade de renda, poder e recursos), fragilizando governos e Estados e sua capacidade institucional de implementar políticas efetivas.” 

O nível de consumo de produtos não saudáveis está relacionado à existência - ou à inexistência - de políticas públicas, medidas regulatórias e legislativas que zelem pela prevenção e promoção da saúde. Estudos evidenciam que a autorregulação por parte de indústrias de produtos não saudáveis é utilizada para atrasar, enfraquecer e evitar o desenvolvimento de políticas públicas efetivas. Assim, urge que sejam adotadas abordagens sistêmicas para atuar sobre a dimensão comercial dos determinantes sociais da saúde relacionados às DCNTs e que se trabalhe sob uma ótica transparente, livre de conflitos de interesse, capaz de garantir a implementação de políticas coerentes e eficazes.

O documento publicado pela OPAS apresenta um marco de referência para abordagem da dimensão comercial dos determinantes sociais da saúde, com o objetivo de contribuir para o avanço da agenda de enfrentamento de DCNTs no país. Cinco eixos de abordagem são propostos pelo Marco: Governança; Modelos de negócios sustentáveis e promotores de saúde; Produção de evidências e disseminação de conhecimento; Advocacy e empoderamento; e Cooperação com atores estratégicos. Para cada um deles, são fornecidas recomendações por meio de linhas de ação, que podem facilitar a adoção de medidas em âmbito municipal, estadual e nacional, bem como fomentar novas pesquisas e a articulação dessa agenda com as políticas públicas e programas já existentes.

 

Como ressalta o documento, a Agenda 2030 de desenvolvimento sustentável, compromisso assumido pelo Brasil e os 192 outros Estados membro da ONU, em 2015, representa uma oportunidade para a renovação da promoção da saúde, buscando interconexão entre diferentes áreas de modo a promover ações integradas e eficazes, que deem conta de dimensões sociais, econômicas e ambientais. A 9ª Conferência Mundial de Promoção da Saúde da Organização Mundial da Saúde (OMS), realizada em 2016, evidenciou as interconexões entre a promoção da saúde e os ODS, destacando a importância de abordar os determinantes comerciais da saúde como forma de contrabalançar interesses econômicos ou comerciais prejudiciais à saúde.

 

Nesta década de ação para que os países cumpram os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) até 2030, é fundamental que sejam instaladas ações inovadoras capazes de promover a saúde e reduzir as desigualdades. Diante da pandemia de COVID-19, este objetivo se tornou ainda mais evidente e urgente. Se buscamos um mundo mais saudável, solidário e sustentável, é preciso olhar agora para as práticas que não condizem com este objetivo e contribuir para o debate de como podemos transformá-las de forma a construir coletivamente o futuro que queremos e necessitamos enquanto humanidade.


Acesse o documento completo em: https://iris.paho.org/handle/10665.2/52975




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