Por uma reforma tributária saudável, solidária e sustentável

14.04.23


Por Carolina Mattar, Marcello Baird e Katia Matia | Valor Econômico

Enquanto a reforma tributária volta ao centro da pauta em Brasília com a ascensão do novo governo, setores da sociedade civil unem esforços para que as discussões possam ir além da necessária simplificação do sistema tributário e levem em consideração o efeito da tributação sobre consumo, renda e patrimônio na qualidade de vida da população.

É notório que o impacto de atividades econômicas no meio ambiente recai diretamente na saúde da população, que depende em grande medida da água e do ar limpo, da produção de alimentos com real valor nutritivo e da preservação dos ecossistemas. Mas não basta gerar os incentivos adequados e corrigir as distorções atuais nos setores produtivos, para atender à demanda crescente e consciente por produtos saudáveis e sustentáveis. É preciso aumentar o poder de compra da população brasileira e fomentar o mercado interno com uma reforma tributária progressiva, capaz de reduzir desigualdades e, também, garantir o acesso das populações empobrecidas aos bens e serviços essenciais para o bem-estar.

As atividades produtivas, se capazes de gerar os chamados "empregos verdes", também atenderão ao anseio de jovens, fazendo do atual “bônus demográfico” do país, um ciclo virtuoso de transição da economia brasileira para a economia do futuro, uma economia de baixo carbono.

 

Um tributo federal sobre produtos nocivos à saúde traria nova fonte de receitas para o subfinanciado SUS

O manifesto por uma Reforma Tributária 3S - Saudável, Solidária e Sustentável, lançado na Câmara dos Deputados no dia 28 de março com a adesão de mais de 70 instituições, apresenta proposições para desestimular o consumo e a produção de produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente e estabelecer um sistema progressivo de impostos sobre renda e patrimônio. As recomendações se sustentam na observação de experiências internacionais exitosas e poderiam ajudar a recolocar o país na rota do desenvolvimento, contribuindo para o cumprimento das metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.

Entre as propostas apresentadas, destacamos, na área de saúde, a criação de um tributo federal específico sobre produtos nocivos, como tabaco, álcool e alimentos ultraprocessados, a exemplo de refrigerantes, bolachas recheadas e macarrão instantâneo. No caso da alimentação, é preciso garantir não apenas o desestímulo aos ultraprocessados, como o incentivo aos alimentos saudáveis, em consonância com o que preconiza o Guia Alimentar para a População Brasileira, de modo a ampliar a oferta e a disponibilidade de alimentos saudáveis e sustentáveis para a população. Os recursos arrecadados com esses tributos deveriam ser vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS), garantindo uma nova fonte de receitas para um sistema que vem sendo cronicamente subfinanciado.

Uma reforma tributária solidária precisa corrigir injustiças sociais. Atualmente, o impacto da carga tributária acaba sendo maior sobre as pessoas empobrecidas, especialmente negras e mulheres. Para reverter a situação, precisamos reduzir a parcela de tributos que incide sobre consumo e as folhas de pagamento e ampliar os impostos sobre renda e riqueza. Mesmo que não seja o foco da proposta atual, seria fundamental que pudéssemos avançar simultaneamente com uma proposta de caráter progressivo para combater as desigualdades.

Em relação à sustentabilidade da reforma, defendemos a inclusão da dimensão socioambiental no regime tributário, integrando os princípios da prevenção, do poluidor-pagador e do protetor-recebedor, bem como a adoção de um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) ecológico para estimular boas práticas em governança ambiental. Faz-se necessário também dispor de indicadores de biodiversidade, preservação de terras e territórios indígenas, comunidades quilombolas, unidades de conservação, saneamento, poluição e gestão de resíduos sólidos, assegurando tratamento diferenciado àqueles que contribuam com o clima e a sustentabilidade no Brasil com a criação de um Cadastro Nacional de Atividades Verdes - “CNAE Verde”. A criação de um fundo de incentivo ao desenvolvimento regional para apoiar o combate às desigualdades sociais e regionais e a integração nacional por meio do fomento direto a atividades produtivas ou investimentos em infraestrutura econômica sustentáveis é indispensável.

Para garantir o funcionamento de um sistema tributário mais justo, saudável, solidário e sustentável, apoiamos, ainda, a revisão de incentivos fiscais a setores econômicos cujos produtos são nocivos à saúde e ao meio ambiente, bem como a criação de uma legislação específica que amplie a transparência, a efetividade e a eficácia dos benefícios fiscais concedidos ao setor empresarial.

Com esse manifesto, apresentamos ao governo e ao Legislativo propostas que acreditamos estar à altura de nossos maiores desafios. Esperamos contribuir para um projeto que valoriza a vida, a justiça social e o planeta, que chamamos de Reforma Tributária 3S: Saudável, Solidária e Sustentável.

Carolina Mattar é formada em Relações Internacionais e coordenadora executiva do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS).Katia Maia é socióloga e diretora executiva da Oxfam Brasil.Marcello Fragano Baird é cientista político e coordenador de advocacy na ACT Promoção da Saúde.Nathalie Beghin é economista do colegiado de gestão do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

 

https://valor.globo.com/opiniao/coluna/por-uma-reforma-tributaria-saudavel-solidaria-e-sustentavel.ghtml




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